Comida afetiva não é o melhor título para esta postagem.
Medo de comida. Agora sim, é sobre isto que quero dialogar com vocês.
Não sei se vocês já esbarraram por aí, internet afora, nessas hashtags - #comida afetiva #comida de conforto #nao tao saudavel #alimentação emocional.
Num primeiro olhar, é bonito, é poético, porém eu comecei a colocar bastante atenção no fenômeno e percebi algo escondido por trás da linda comida afetiva.
A frase que abre esta postagem exemplifica minha percepção.
O contexto era uma bonita foto numa mesa de toalha e louça claras, flor, e um prato de talharim de encher os olhos e dar água na boca.
Mas junto a esse cenário e momento bonito, apetitoso, vem a justificativa - não é tão saudável, mas é comida de conforto que aquece a alma.
E tantas outras postagens cuja legenda esconde e justifica um medo. "Olha, mas não é fritura viu?!"
"Ah, não é sempre que eu como isso, é porque minha avó fez né?!" "De vez em quando pode".
Estamos com medo da comida e por isso nos justificamos tanto.
Afastamos-nos tanto da comida caseira, ganhamos muito conhecimento com novas descobertas, pesquisas, somos constantemente assolados por notícias de famosos que comem "tal e tal"para se manterem jovens, não comem isso porque faz mal, ou comem aquilo porque faz muito bem. E além de perdidos com tanta confusão, o medo está assombrando nossas fotos mais lindas de comida.
Disfarçamos com nossas justificativas.
E sentimos vontade, necessidade dessa comida afetiva, dessa comida que aquece a alma.
E não deveríamos ter medo dela.
Equilíbrio, moderação, temperança é o que nos faz bem.
Por outro lado, há um movimento sem medo. Um movimento com alegria de resgate dos antigos cadernos de receita de nossas avós, mães, tias, madrinhas.
Ah! Como eu me lembro de minha mãe recortando "selos" que vinham na embalagem do café Seleto; mandou-os todos pelo correio e recebeu um livro em espiral, capa verde com receitas.
Já folheei cadernos de receita amarelados, uma e outra mancha de um dedo engordurado.
E para não ter medo de comida, duas fotos que estavam no meu celular.
Foram tiradas em julho deste ano, lá na fazenda onde mora Tiana, minha sogra.
A legenda é longa:
Os dias de férias foram passados lá. Montanhas cercam a casa. O vizinho próximo, uns cinco, dez minutos de carro. Ao redor, vacas, pasto, café plantado, mudas de café, casal de gansos, galinhas soltas.
Compra do mês é literal ali. Nos outros 29 dias, corre lá na horta e apanha tomatinhos para a salada.
Eu achei na despensa uma caixinha de leite condensado, um achocolatado para vencer e não tive dúvidas: fogo, manteiga na panela e vamos de brigadeiro de colher.
Minha sogra que pouco enxerga, começou a me rodear na beira do fogão. E eu ralhando com ela para sair dali.
Não adiantou. Ficou ali em roda até eu colocar o doce no prato e como ela já estava trocada, banho tomado, falei bravo para ela sair dali que iria se sujar na pia.
Então ela me revelou o que queria:
"Me dá a panela que eu quero "rapá"
Tô aqui te rodeando que é pra você não colocar água na panela!
Saiu de perto de mim e foi raspar a panela em paz debruçada na sua janela!