Apressada,
chaveou o portão e entre guardar as chaves na bolsa, olhar para os
lados para atravessar a rua, deparou-se com o que
chamou de “uma cena a ser retratada num quadro”.
Sentado, com as costas recostadas num muro pichado, estava um homem. Precisar
sua idade era difícil; tinha na pele todas as intempéries do tempo
e talvez carências de afeto. Talvez...
Tirou
a pressa dos passos e passou por ele vagarosamente.
Comia
bolachas recheadas de uma marca vagabunda e ao seu lado, também
apoiado no muro, um maço de bambus.
Era
um vendedor de bambus. Possibilitava que cordas, pregadores e roupas
fossem alçados para mais perto do sol. Era um homem que ajudava o
vento a acariciar roupas, cobertas, cortinas, toalhas.
A
moça entrou no mercado. Passou pelo setor de máquinas de lavar e
constatou como estavam avançadas. Trouxeram o vento e o sol para
dentro delas. Eram máquinas modernas que além de lavar, também
secavam toda a roupa.
As
bolachas reachadas vagabundas que aquele homem comia não eram
vendidas naquele mercado. É provável que ele nunca entrara ali. Não
conhecia as modernas máquinas que aniquilavam seus bambus.
Sentiu
um lamento dentro do peito. Um homem que tira seu sustento de vender
bambus em ruas onde se erguem edifícios que não há lugar para
bambus, apenas para máquinas que devolvem a roupa seca? E nas casas?
Alguém na cidade compraria um bambu?
Retornou
do mercado e ele não estava mais ali.
Entrou
em casa, deixou as compras sobre a mesa e foi até o quintal.
Olhou
demoradamente para o seu varal. Já estava bem curvado, feito sorriso
em desenho de criança. Sorriu. Naquele momento soube que precisava
de um bambu para o seu varal.
O
homem estava certo em seu caminho: entre prédios, casas com máquinas
modernas, haviam varais esperando para serem içados.
Tempos
depois avistou o homem já longe, subindo uma ladeira, com seu feixe de bambus apoiado nas costas, ali pelos
arredores. Deve ter voltado porque ouviu o chamado de algum varal, de
algum lençol que desejava esvoaçar lá do alto.
Dura realidade ainda dos homens sendo substituídos por máquinas, mas que teu coração alcançou.
ResponderExcluirAna Paula, que postagem gostosa de se ler. Fico muito feliz de saber que os varais ainda precisam dos bambus e que o sol ainda é o rei dos astros e a melhor opção para secar e "esterilizar" nossas roupas. Está faltando uma postagem do romântico QUARADOR que nossas avós usavam para deixar as roupas mais branquinhas. Linda a postagem, Ana Paula.
ResponderExcluirBeijo!
Manoel - Blog do Óbvio
Te ler faz um bem danado! Nas coisas simples ,tanta beleza !
ResponderExcluirE uma pena que tudo esteja tão diferente. Nos apartamentos nem temos espaços para varais. São secadores de fios ou, conforme a idade e os joelhos da dona da casa, aqueles de chão, de abrir...
E nada supera o cheiro de uma roupa seca ao sol... Que pelo menos nas casas as pessoas usem os varais. Fico feliz ao chegar na minha janela, de onde vejo pátios, cheias de roupas ao vento e sol!
Lindo te ler! bjs, tudo de bom,chica
Insistir em ajudar o vento,em trazer sorrisos aos varais, é sintoma presente n'almas simples, aquelas que realmente valorizam o belo e o bom.
ResponderExcluirTua alma poética traduz nestas linhas as belezas simples e verdadeiras, Ana.
Uma igualmente bela semana.
Bjos,
Calu
Ana, que história doce! :D
ResponderExcluirA modernidade infelizmente tira mesmo o espaço de muita gente no mercado de trabalho, assim como capacita outros, mas há sempre varais à espera, até por que nem todos tem acesso aos luxos da modernidade. Nesse caso às vezes tenho medo da velocidade da evolução das coisas.
Lembrou-me as ripas que meu pai sempre preparou com um corte em V para sustentar os varais da casa da minha mãe, e que eu sempre saía correndo quando, quando já leve pela retirada das roupas, escorregava e caía em qualquer direção, hahaha!
Um abraço!
Blog encantador,gostei do que vi e li,e desde já lhe dou os parabéns, também agradeço por partilhar o seu saber, se desejar visitar o Peregrino E Servo, ficarei também radiante
ResponderExcluire se desejar seguir faça-o de maneira que possa encontrar o seu blog, porque irei seguir também o seu blog.
Deixo os meus cumprimentos, e muita paz.
Sou António Batalha.
Que bela crônica, Ana Paula! Amei a caracterização do sujeito como "um homem que ajudava o vento a acariciar roupas, cobertas, cortinas, toalhas" - lindo!
ResponderExcluirAbraço!
Que lindo, Ana Paula! Ajudar o vento, ouvir o chamado do varal! Coisas simples. Sqn. Adorei. Bjs Marli
ResponderExcluirLindíssimo seu conto,Ana! Nos dias de hoje ainda pode haver espaço para bambus! bjs e boa semana,
ResponderExcluirBom dia!
ResponderExcluirQue lindo texto! Que coisa, um homem que vendia bambus para varais!... Saudades da minha mãe estendendo a roupa no quintal. Eu, pequena, passando entre os lençóis olhados...
Que linda crônica. Trouxe de volta um pedacinho do passado e fico pensando que nunca vi alguém vendendo bambu apesar de que na casa dos meus pais tínhamos bambus a levantar o varal. Eram tão naturais, estavam sempre presentes e eu nunca me perguntei de onde vinham.
ResponderExcluirNossa, que belo texto!
ResponderExcluirAinda bem que ainda restam pessoas como você que encontram poesia até nos bambus dos varais!!!
Saudades desse tempo...
Minha avó ainda estende roupas nos varais de bambu e ainda põe as roupas para quarar no sol....
Nunca soube dessa varas, desses moços.
ResponderExcluirLá na casa de minha mãe, ripas de madeira dos feitos de meu mais ou cabos daquelas vassouras de espanar o teto, faziam esse papel.
Tenho candura por pregadores e varais, temos não é mesmo :)
Bambu tem aos montes, fazendo túnel na entrada (e saída) do aeroporto daqui de Salvador. Incrível que não tenho nenhuma foto lá, vou te esperar para gente tirar juntas(os) \o/
* meu mais seria meu pai (certo de uma certa forma)
Excluiro s do dessas despregou com o vento :)
Adorei o seu texto. Simples mas que nos faz refletir como a tecnologia faz com que várias pessoas percam o seu sustento em coisas que tornam a nossa vida urbana e mega tecnologica sem uso. Adorei
ResponderExcluirbeijos
Adriana
Qt delicadeza presente nos teus textos menina,tu tiras otimas coisas daquilo que nao se vê. Mt bom te ler Ana Paula, e adorei tbm o tirou a pressa dos pés...que lindo.
ResponderExcluirHistórias que retratam vidas reais.
ResponderExcluirBeijos
Você colocou poesia em um jeito tão difícil de alguém sobreviver. E sua crônico ficou ótima. Bjs.
ResponderExcluir