sábado, 1 de agosto de 2015

Receita na Blogagem Coletiva

Primeiro sábado do mês, abrindo agosto, teremos vários gostos na proposta de uma receita na Blogagem Coletiva organizada por Tina e eu.
Mas, receita, eu?
Não, não sou boa em receitas. Consigo até executá-las como no caso de uma receita de quiabada que me foi enviada. Certamente não serei lembrada pelos meus quitutes.
Recorri então ao meu marido. Pedi a ele que escrevesse sobre suas receitas, que eu adoro!
Então, pilotando os teclados, Donisete.

A Paula me pediu para escrever sobre minhas receitas. Nós conversamos muito sobre o meu trabalho e eu gosto de contar para ela os casos dos mais peculiares aos mais simples que tanto nos ensinam.
Eu atendo num hospital público, em sua maioria são velhos e muito carentes. Acho que tenho a alma com cheiro de naftalina porque os velhos gostam de passar comigo e eu adoro atendê-los!
Atendi a um velhinho que entrou na saleta acompanhado de duas filhas. Ele se queixou, falou bastante, eu fui perguntando e sabendo mais da vida dele. As filhas, separadas, moravam na casa dele com os netos que ele ajudava a sustentar com a pouca aposentadoria. Receitei a ele o seguinte: o remédio apropriado para seu caso e acrescentei: "Seu Joaquim, o senhor vai beber esse comprimido à noite com chá. Deita na sua cama e pede pra uma das filhas fazer um chá bem quente e toma o comprimido e fica lá cama bem quietinho e vai falar pra elas que o senhor não pode ser incomodado. Volta aqui a semana que vem".
Ele abriu um sorriso e olhou para as filhas. "Escutou, não é para me incomodar."
Aquilo para ele foi um luxo!
Quando voltou na semana seguinte, já estava corado e com brilho nos olhos.
Disse que fez direitinho, tomou o comprimido na cama com o chá quente e ficou ali quietinho, teve noite que rezou, teve noite que veio muitas lembranças de quando ele era menino.

E num outro atendimento, eu receitei fotografia e choro.
Era um caso bem triste. O filho entrou com a mãe idosa num domingo à noite dizendo "Doutor minha mãe precisa de um antidepressivo, ela perdeu um filho, hoje faz sete dias que ele morreu, nós viemos da missa direto para cá".
Ouvi o filho que relatou que durante esses sete dias, mesmo sabendo que não era certo, eles estavam dando um remédio para a mãe dormir a maior parte do dia e também à noite.
Comecei então a conversar com a senhora que me contou que o filho tinha sido assassinado. Perguntei se moravam juntos, ela respondeu que sim e perguntei se ela já havia voltado para casa e ela disse que não, estava ficando na casa do filho que a acompanhava.
Então perguntei se ela queria e se sentia preparada para voltar.
Ela respondeu que era tudo o que ela mais queria: entrar no quarto dele e pegar nas coisas, nas roupas que foram dele.
Foi então que receitei que olhasse as coisas, sentisse o cheiro, pegasse em fotografias que ela disse ter em vários álbuns e chorar, chorar tudo o que estava preso ali. Aquela mulher tinha uma tristeza imensa que não estavam deixando ela sentir. Muitas vezes por amor, querendo evitar o sofrimento de quem amamos nós podemos cometer erros.
Naquele momento de sete dias apenas do acontecido, não era remédio para depressão que ela precisava. Era choro, carinho, boa alimentação.
Ela me deu um aperto de mão forte, bem forte, de quem estava determinada. O filho agradeceu. Não sei se agradei a ele, mas fiz o que achava certo.

E então, tire as suas receitas da gaveta e traga paz a blogagem!
De comida, de tricô, de artesanato, de deixar a casa mais bonita, enfim...
E vai preparando para setembro, no primeiro sábado foto da sua infância. Revire os baús!
Aqui as participações que vem chegando!



10 comentários:

  1. Suspiros e meu gostar de médicos
    Desse tipo de médicos, médico com conversas que curam, com receitas de vó, com o juramento da formatura levado para o consultório e para vida
    Tenho no bolso o cheiro de naftalina e porque que não assumir, bossalidade de achar o máximo dizer meu filho, pai, marido, irmão...é médico
    Receitas passadas
    Reflexões
    Vou passar mais açúcar com canela nas bananas que estão saindo por lá

    E o tema da próxima BC comadre Ana?

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  2. Na próxima Tina, com os ventos de primavera que se aproximam, vamos colocar uma foto da nossa infância!

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  3. É de mais receitas assim que estamos precisando,gostei muito,lembrei do meu pai ao ler. Ele não era médico, mas um homem sábio, que sempre tinha uma receita assim para nos fazer ver as coisas de um modo especial, acho que gente assim lê a alma do outro.
    Abraços.
    Sonia A.

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  4. Ana Paula que emocionante ler as receitas de esse médico que cura a alma :)
    beijinhos, volto em breve
    Angela

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  5. Que lindo,Ana Paula! receitas que fazem realmente bem e saem do coração que ouve, fica atento ao que REALMENTE o paciente precisa!" Adorei!

    Um beijo, já em casa, já "Marinando", chica

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  6. Ana Paula, que casal especial vocês formam!

    Donizete, meu colega de profissão, que alegria ver que ainda existem médicos como você. Fiquei emocionada com cada uma das suas receitas. Me lembrei dos tempos em que atendia no Hospital das Clínicas e no Emílio Ribas aqui em São Paulo...quantas histórias...na maioria das vezes os pacientes precisam de alguém que os ouça com o coração. Parabéns pela sensibilidade e pela coragem de demonstrá-la, e principalmente por ser fiel aos seus valores.
    Grande abraço

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  7. Ah, Ana Paula, fico feliz que tenha gostado do post e mais ainda por saber que minhas leitoras vieram te conhecer, seu blog é muito bom, merece ser partilhado.
    Bjs

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  8. Linda receita de amor e carinho. Ana esqueci a data do sábado aind apode participar?

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  9. Meu pc meio que quebrou por esses dias, meu irmão deu uma de doido e não fez nada para consertar, meu primo resolveu hoje... perdi o dia postagem... Que dor!

    A parte isso, que post lindo, que receitas lindas... eu acho que vivo em um constante estado de emotividade porque não tem como não se emocionar com receitas assim, contadas com essa delicadeza!

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  10. Ele não é médico do SUS né? #Zuera. rs
    Zuera com uma forte dose traumática de médicos do SUS que nem olham na nossa cara, tudo é virose e enfiam qualquer remédio que tem no posto. Muitas vezes nem isso tem!
    Achei comovente as receitas cedidas pelo seu marido, precisamos muito de mais profissionais assim na saúde, que tenha humanidade.
    Adorei a participação na BC e assim como você, também não serei lembrada pelos meus quitutes, só sou boa em doces. rsrsrs.
    Beijos

    Rivotril com Coca-Cola

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