quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Arte e Bênçãos

 "É preciso muita arte para se blindar de tantas coisas ruins acontecendo pelo mundo.

Os últimos relatos são estarrecedores, mas a gente vai teimar em esperar um mundo melhor".                                                Toninho


A partir do comentário, que transcrevi acima, deixado na minha última postagem, foi que me inspirei a encontrar arte para trazer, um pouco que seja, de leveza aos dias pesarosos.

Fotografia é uma arte que transmite tanto e escolhi uma fotografia que a mim, evoca a paz. Aliás o nome da planta é lírio da paz.




E também quero trazer um texto de autoria de Rachel Naomi Remen que fala de bênçãos. A bênção de um avô.

Achei-o tão lindo, delicado, a arte em palavras que tem o poder de nos nutrir!


Abençoando

Nas tardes de sexta-feira, depois da escola, quando eu chegava à casa de meu avô, o chá já estava servido sobre a mesa da cozinha. Meu avô não bebia o chá da mesma maneira que os pais de meus amigos. Ele colocava um cubo de açúcar entre os dentes e tomava o líquido quente direto do copo. Eu fazia o mesmo. Preferia assim à maneira como me ensinaram em casa.


Depois do chá, vovô colocava duas velas sobre a mesa e as acendia. Então, conversava um pouco com Deus, em hebraico. Algumas vezes falava alto, mas em geral fechava os olhos e ficava em silêncio. Eu sabia que ele estava falando com Deus pelo coração. Ficava sentada e esperava pacientemente, pois a melhor parte da semana estava para começar.


Quando terminava de falar com Deus, ele olhava para mim e dizia:

 - Venha cá, Neshumele.

Eu ficava de frente para ele, e vovô apoiava as mãos suavemente sobre minha cabeça. Começava agradecendo a Deus pela minha existência e por fazer dele o meu avô. Mencionava especificamente os meus progressos naquela semana e contava a Deus alguma informação a meu respeito. A cada semana eu esperava para ver qual seria. Se eu tivesse cometido erros, ele falava da minha honestidade em dizer a verdade. Se houvesse algum fracasso, ele valorizava o quanto eu tinha me esforçado para acertar. Se até tivesse tirado uma soneca com a luz do quarto apagada, ele festejava a minha coragem por dormir no escuro. Então, vovô me abençoava e pedia às mulheres do passado, que eu conhecia de tantas histórias - Sara, Raquel, Lia e Rebeca -, que tomassem conta de mim.

Aqueles eram os únicos instantes da semana em que eu me sentia totalmente segura e em paz. Os membros da minha família, quase todos médicos e profissionais da saúde, lutavam para aprender e progredir cada vez mais. Nada era suficiente, havia sempre um novo nível de exigência. Se eu tirava 98 numa prova, o comentário de meu pai era:

 - O que aconteceu com os dois pontos que estão faltando?

Corri atrás daqueles dois pontos, sem descanso, durante toda a infância. Mas meu avô não se preocupava com isso. Para ele, eu já era o suficiente. E de alguma maneira, quando eu estava com ele, tinha a mais absoluta certeza de que isso era verdade.


Meu avô morreu quando eu tinha 7 anos. Foi muito difícil para mim, pois nunca vivera num mundo sem ele. Ele me chamava por um nome especial, "Neshumele", que quer dizer "querida alma pequenina". Mais ninguém me chamava assim.

No começo, fiquei com medo de que, sem ele para olhar por mim e contar a Deus quem eu era, eu desaparecesse. Mas, com o passar do tempo, comecei a entender que, de alguma forma misteriosa, eu tinha aprendido a me ver através dos olhos do meu avô. E que, uma vez abençoados, estamos abençoados para sempre.


Muitos anos mais tarde, quando, já bem velha, minha mãe começou a acender velas e a conversar com Deus, contei sobre aquelas bênçãos e quanto elas significaram para mim. Ela sorriu e disse:

 - Eu abençoei você durante toda a minha vida, Rachel. Só não tive a sabedoria de fazer isso em voz alta.

Rachel Naomi Remen



14 comentários:

  1. Bela inspiração. O meu aplauso e elogio. Cumprimentos poéticos

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  2. Boa tarde de paz, querida amiga Ana Paula!
    Nosso amigo Toninho é um manancial de palavras belas.
    Vamos nos blindando com preces das crueldades da atualidade.
    Gosto muito do lírio da paz e o vejo todo dia num canteiro próximo. É inspiração.
    Seu post é para ser lido devagarzinho, caindo na alma do leitor:
    "Eu sabia que ele estava falando com Deus pelo coração. "
    Quanta verdade do vovô! Haverá outra maneira de falar com Deus? Eu a desconheço...
    Meu avô nordestino era muito carinhoso também, me fazia dengos mil.
    Mas o pequeno apelido carinhoso do seu é de encantar o espírito:
    "querida alma pequenina".
    Quanto às notas escolares, eu não era suficiente..., a exigente 'sargenta' exigia dez em tudo e eu sofri uma disidrose aos dez aninhos. Foi difícil de curar.
    Enfim, Rachel tinha toda razão, temos que fazer-nos visível no carinho e no amor.
    Amei ler o de hoje desde o início ao fim.
    Deus abençoe você e o Toninho com ricas bênçãos.
    Tenha um feriadão abençoado!
    Beijinhos com carinho fraterno




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  3. Adoro os comentários sempre lúcidos e sensatos do nosso querido Toninho!

    E esse texto que trouxeste, um presente pra todos nós! ADOREI!

    beijos praianos, feliz feriado, bem abençoado e brincante... chica

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  4. Olá, Ana Paula, muito bonito o que nosso amigo Toninho escreveu, sem dúvidas.
    É persistência, e por que não? Tentar é legítimo.
    Quanto ao texto de Rachel Naomi Remen, é lindo, é terno, uma vida linda para recordar...
    Então, comecei a pensar nos meus avôs, paterno e materno. Meu avô paterno, faleceu quando eu era
    muito pequenina, não lembro dele, só em fotos e histórias. Meu avô materno, morreu sem eu conhecê-lo, ainda bebê!
    Então de avô, não tive lá muita sorte, rsss...
    Muito show tua postagem!
    Um bom restinho de semana,
    com paz e saúde!
    Beijo

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  5. Querida Ana Paula,
    O mundo precisa da paz, de amor, de gentileza e solidariedade. Infelizmente quem tem o poder para mudar a vida das pessoas preferem o confronto, a guerra, a destruição e o ódio. Não iremos criar um mundo melhor desta forma e isso é muito triste para as novas gerações que estão vindo e qual mundo queremos deixar para as nossas crianças? Achei lindo o texto que você nos compartilhou, essa pureza das crianças deveria ser um incentivo para criarmos um mundo melhor para todos. Eu acredito na paz, ela é o único caminho possível.
    Um abraço!

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  6. O comentário de Toninho e a partilha como um todo esbanja sabedoria!
    Abraços fraternos!

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  7. Um texto onde privilegia os pensamentos dos amigos e que demonstra a lucidez e a
    delicadeza que sempre encontro aqui, Ana.
    Toninho foi feliz quando diz que teimar é o que mais precisamos ultimamente e crer que
    outros momentos virão e serão melhores. O texto da Naomi é de uma ternura que os avós
    tão bem nos oferece _ e ela contou de forma gostosa, enquanto lemos vamos sentindo o amor
    entre a menina Neshumele e o vó querido.
    Uma semana de Paz é o que desejamos . Com meu abraço

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  8. Como disse nosso querido Toninho, precisamos, e muito, de mais arte. E como precisamos. E que belíssimo texto da Rachel. Não sei para quem a bênção é mais importante. Se para aquele que é abençoado, ou para aquele que abençoa. Sim, pois a confiança e alegria de quem recebe a bênção é gigante, mas para quem abençoa, é um livramento, uma ação de generosidade que apazígua qualquer momento pesado, qualquer desconforto. O ato de abençoar é um momento único, onde podemos transformar o dia de alguém. Que belo.
    Ana, minha querida amiga, os dias aqui andam difíceis, com muito trabalho. Então, perdoa o sumiço desse teu amigo.
    Grande abraço, e linda semana pra ti e família.

    Marcio

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  9. Uma linda postagem, estamos num momento de cuidarmos para que não sejamos refém da tormenta que assola o mundo. Precisamos de ter paz em nosso coração e mensagens como esta nos acolhe. Grata por suas visitas e comentários que sempre acrescentam . Sigamos cuidando e semeando a PAZ de todas as formas que pudermos. Tenho um vasinho com o Lírio da paz, mas ele não está florindo, mas não desisto de cuidá-lo. Boa noite, bjsss

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  10. Ahhhhhh que post mais lindo! Estou afastada há dois meses e neste retorno o seu é um dos primeiros que visito e tenho essa deliciosa recepção. Foto linda e texto perfeito, que emociona e faz um quentinho no coração. Texto, aliás, muito bem escrito.
    Beijo, beijo, querida.
    She

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  11. Bom dia Ana Paula,
    Que comentário tão belo do querido Amigo Toninho que a inspirou trazendo esse texto maravilhoso.
    Sábio e terno esse Avô que passou para seu netinho valores tão preciosos.
    Uma bênção ler este texto.
    Muito obrigada por tê-lo partilhado.
    Beijinhos,
    Ailime

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  12. Ana,
    que bálsamos vc nos presenteia aqui: a arte da fotografia simbólica, a arte da narrativa emotiva e tocante. Vemos contritos os últimos acontecimentos agarrando-nos à esperança de Paz realmente acontecida em todo o mundo.
    São palavras de alento e bênçãos como estas que nos impulsionam na firmeza da fé e da paz.
    Grata pela linda e necessária partilha.
    Bjsss, querida.
    Carmen

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  13. Oh, que honra e alegria aparecer aqui para uma geral na sua pagina e ver uma referencia a um comentário meu e ser ilustrado com uma linda historia de amor e fé. Que maravilhosa partilha com esta querida alma pequenina.
    Emociona e o final é fantástico com a observação da mãe.
    Assim somos no silencio carregando belos desejos aos que amamos.
    Amei Ana.
    Grato
    Abraços na paz.

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  14. Vir aqui, é encontrar um lírio da paz, literalmente!
    Que mensagem linda, edificante.
    É um ponto de luz, que ilumina e aquece os corações.
    E complementando as palavras do querido Toninho, vamos esperar um mundo melhor, fazendo a cada dia gestos como esse, espalhando amor em casa, na rua, nas palavras...
    Beijos no coração,
    Ju

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