Minha filha assisti à novela "Flor do Caribe", horário este que geralmente eu estou pela cozinha.
Dias atrás, a Júlia foi até a cozinha para me contar que a novela não estava muito boa porque uma personagem que todos acreditavam ter morrido, apareceria de repente vivo, surpreendendo a todos que haviam chorado a sua morte.
E ela ainda me disse estar preocupada com as pessoas que tem um familiar que morreu e ficar se iludindo com a possibilidade desta pessoa voltar.
Achei interessante a observação da menina que mesmo sem assistir a uma outra novela, disse que "uma novela parecia estar copiando a outra porque lá também tinha alguém que morreu e voltou".
Eu, ainda criança, devaneei inúmeras vezes que a minha mãe voltaria. Pensei que isso fosse coisa só de criança.
Hoje, lendo o jornal me deparei com a seguinte matéria ( Folha de S.Paulo caderno Cotidiano 09/04/2013):
"No auge da balada celestial, o Pai perguntou se alguém queria voltar. Dois ou três disseram que sim e foram encontrados vivos no caminhão frigorífico que transportava os corpos ao ginásio"- trecho do livro Uma porta para o céu do padre Lauro Trevisan.
Entre a justificativa que escreveu isto para confortar as famílias e as famílias alegando falta de respeito e exigindo que se tire de circulação o livro, eu fico a pensar na nossa fuga do luto.
Vivemos um momento da história onde a felicidade parece ser imperativo: fotos deslumbrantes com lindos dizeres espalhadas pelo mundo virtual, as celebridades nas capas de revistas, a publicidade esbanjando pessoas jovens, corpos lindos, carros, cervejas, dentes brancos, cabelos lisos...
O luto não é algo que se deseja, quando acontece, ele precisa ser vivido. É parte essencial para diluir a dor.
Olá Ana Paula, boa noite! Mais um texto seu muito bem pensado! Acho que em algum momento da vida a gente passa por essa fuga, mas um dia percebe a verdade e vê a vida diferente! Parabéns....
ResponderExcluirTe desejo uma ótima quarta-feira!
Bjs
CamomilaRosa
Muito certo e a observação da Julinha á de quem sabe o que diz. O luto deve mesmo ser respeitado e sentido, vivido. Ninguém pode vivê-lo no lugar do outro... Lindo e reflexivo teu texto! beijos,chica
ResponderExcluirMuito certo o que sua filha percebeu, nunca tinha pensando por esse ângulo, e olha que eu penso demaaaais... rs.
ResponderExcluirO luto realmente é para ser vivido, como qualquer momento de tristeza. Esse culto a felicidade permanente me irrita.
Beijocas
Ana Paula, muito importante essa sua postagem. É fundamental sabermos mostrar para as crianças que temos um princípio e um fim. Não há coisa mais certa do que isso e eu não acho normal que a pessoa morra e depois volte.
ResponderExcluirÉ importante viver o luto para poder sentir a realidade do falecimento. Independente de diversas religiões e seitas, cada uma com suas devidas explicações, não vem ao caso a gente não explicar direitinho para a criança com o objetivo de não virar um pequeno trauma com um sofrimento desnecessário. Dizem que luto é coisa antiga, mas...
Beijo
Manoel
Parabéns à Julinha pela sensinbilidade, e por questionar sobre um assunto que ela não domina.
ResponderExcluirAliás, ninguém domina!
O luto é uma fase de interioração, de muitos pensamentos e poucas palavras. E interessante, certa vez ouvi uma pessoa dizendo que precisa passar a "época do nojo" para começar a melhorar.
Hoje eu entendo o que é essa "época do nojo". Logo após a morte de alguém que amamos sentimos náuseas, é uma sensação estranha, nada psicológica. É físico mesmo, toma conta do estômago e do peito.
Isso vai passando, passando, e um dia esse mal estar foi embora. Fica apenas a saudade, enorme.
Uns chamam luto, outros chamam nojo, e deve haver vários apelidos.
O que sei é que é horrivel.
Beijos minha querida.
Acho lindo os diálogos da sua família porque eles mostram pessoas que questionam e não simplesmente aceitam. A perda de alguém que amamos não acontece no dia da sua morte. Ela vai acontecendo aos poucos: o telefone não toca mais, as festas importantes continuam a acontecer sem a sua presença, não tem e-mail, o carteiro não traz mais os seus presentes, quando percebemos que não temos para quem contar as novidades ou comentar o livro que acabamos de ler. É o que chamo da dor da primeira vez sem.
ResponderExcluirAs pessoas aceitam ler e ver e ouvir histórias e realidades sobre romances, traições, crimes, mitos, fantasias, monstros, vampiros, tudo é possível, tudo é permitido ai quando o assunto é morte e pós-morte, lacunas, silêncios, abafamentos proibições, fuga do que não se aceita, entende, sabe.
ResponderExcluirEu sempre digo que as pessoas, na sua maioria, não são educados para morte e nem para perda de uma maneira geral, eu não fui e tenho tentado desde a perda de meu avô trabalhar isso em mim e dar uma nova visão e trato com o assunto a meu filho e aos que cruzam meu caminhos mexidos e doídos por suas perdas.
Sempre sofri com mortes vistas na tv, não queria saber de ouvir falar em espíritos e enterros, enterrei passarinhos com rituais e lágrimas que meu filho fez serem repensadas ao atravessar a rua comigo e minha mãe e ela tentar esconder dele um pássaro atropelado no asfalto, ele disse: isso acontece. Como disse ao eu pensar como diria da partida do bisavô e ele antes de u dizer qualquer coisa, falou para mim: eu já sei, vc ta triste, mas ele já tava muito velhinhos, é assim mesmo. Ele tinha 7 anos.
E não ele não é frio ele vive e vê a vida sabendo que ela acaba.
As pessoas sofrem e sentimentalizam sem racionar por um ente ou amigo que vai morar fora, sim é sofrido, mas e os horizontes, sonhos, necessidades daquela pessoa?
É encarar os fatos e viver a partida.
Assim é com a morte, que para mim significa a perda da pessoa em seu estado material, se mais naturalmente (por idade ou doença, menos chocante ao meu ver), se por acidente, precocemente, envolve outras dores.
A morte não precisa apagar os nomes dos mortos de nossa fala, seus retratos das nossas estantes, o contar e recontar das histórias, o falar e viver a dor e a saudade pela falta em dias de festa, de agradecer pelo dia em que nasceram, pois a morte não exclui a vida.
E se podem voltar e se estão em outro plano e se enterramos ou cremamos, se é a morte de um amigo, um pai, um filho, um animal, um ídolo...
Se levamos flores ou arroz, damos todos os seus objetos ou deixamos no mesmo lugar, cada um deve fazer o que se sente bem, mas sem fugir, olhando de frente, de dentro, chorando ou silenciando, viajando ou se isolando.
Penso, falo, ouço, assisto, leio sobre o assunto e tenho outros olhares e sentimentos hoje, regados de fé e poesia.
Seguem palavras e relatos de Leonardo Boff.
ResponderExcluirDois quase post´s dentro de seu post :)
"Há muitos estudos especializados sobre o luto. Segundo o famoso casal alemão Kübler-Ross há vários passos de sua vivência e superação.
O primeiro é a recusa: face ao fato paralisante, a pessoa, naturalmente, exclama:”não pode ser”; “ é mentira”. Irrompe o choro desconsolado que palavra nenhuma pode sustar.
O segundo passo é a raiva que se expressa:“por que exatamente comigo? Não é justo o que ocorreu”. É o momento em que a pessoa percebe os limites incontroláveis da vida e reluta em reconhecê-los. Não raro, ela se culpa pela perda, por não ter feito o que devia ou deixado de fazer.
O terceiro passo se caracteriza pela depressão e pelo vazio existencial. Fechamo-nos em nosso próprio casulo e nos apiedamos de nós mesmos. Resistimos a nos refazer. Aqui todo abraço caloroso e toda palavra de consolação, mesmo soando convencional, ganha um sentido insuspeitado. É o anseio da alma de ouvir que há sentido e que as estrelas-guias apenas se obscureceram e não desapareceram.
O quarto é o autofortalecimento mediante uma espécie de negociação com a dor da perda: “não posso sucumbir nem afundar totalmente; preciso aguentar esta dilaceração, garantir meu trabalho e cuidar de minha família”. Um ponto de luz se anuncia no meio da noite escura.
O quinto se apresenta como uma aceitação resignada e serena do fato incontornável. Acabamos por incorporar na trajetória de nossa existência essa ferida que deixa cicatrizes. Ninguém sai do luto como entrou. A pessoa amadurece forçosamente e se dá conta de que toda perda não precisa ser total; ela traz sempre algum ganho existencial.
O luto significa uma travessia dolorosa. Por isso precisa ser cuidado. Permito-me um exemplo autobiográfico que aclara melhor a necessidade de cuidar do luto. Em 1981 perdi uma irmã com a qual tinha especial afinidade. Era a última das irmãs de 11 irmãos. Como professora, por volta das 10 horas, diante dos alunos, deu um imenso brado e caiu morta. Misteriosamente, aos 33 anos, rompera-se-lhe a aorta.
Todos da família vindos de várias partes do pais, ficamos desorientados pelo choque fatal. Choramos copiosas lágrimas. Passamos dois dias vendo fotos e recordando, pesarosos, fatos engraçados da vida da irmãzinha querida. Eles puderam cuidar do luto e da perda. Eu tive que partir logo após para o Chile, onde tinha palestras para frades de todo o Cone Sul. Fui com o coração partido. Cada palestra era um exercício de auto-superação. Do Chile emendei para a Itália onde tinha palestras de renovação da vida religiosa para toda uma congregação.
A perda da irmã querida me atormentava como um absurdo insuportável. Comecei a desmaiar duas a três vezes ao dia sem uma razão física manifesta. Tive que ser levado ao médico. Contei-lhe o drama que estava passando. Ele logo intuiu e disse: “você não enterrou ainda sua irmã nem guardou o luto necessário; enquanto não a sepultar e cuidar de seu luto, você não melhorará; algo de você morreu com ela e precisa ser ressuscitado”. Cancelei todos os demais programas. No silêncio e na oração cuidei do luto. Na volta, num restaurante, enquanto lembrávamos a irmã querida meu irmão também teólogo, Clodovis, e eu escrevemos num guardanapo de papel o que colocamos no santinho de sua memória:
“Foram trinta e três anos, como os anos da idade de Jesus/Anos de muito trabalho e sofrimento/Mas também de muito fruto/Ela carregava a dor dos outros/Em seu próprio coração, como resgate/Era límpida como a fonte da montanha/Amável e terna como a flor do campo/Teceu, ponto por ponto, e no silêncio/Um brocado precioso/Deixou dois pequenos, robustos e belos/E um marido, cheio de orgulho dela/Feliz você, Cláudia, pois o Senhor voltando/Te encontrou de pé, no trabalho/Lâmpada acesa/Foi então que caiste em seu regaço/Para o abraço infinito da Paz”.
Entre seus papéis encontramos a frase:”Há sempre um sentido de Deus em todos os eventos humanos: importa descobri-lo”.
Até hoje estamos procurando esse sentido que somente na fé o suspeitamos."
Oi Ana Paula... a Júlia é uma menina muito sensível mesmo e pelo visto bastante solidária. Esta preocupação dela é bastante pertinente, visto que outras crianças, assim como ela, estão assistindo e, assim como você, perderam alguém importante e tem um enorme desejo de ter esse alguém de volto. No entanto, volto a concordar com você quando diz o quanto o luto é necessário, assim podemos de uma vez por todas entender que uma perda assim é definitiva e a dor vai diminuindo com o tempo, apesar da lembrança.
ResponderExcluirbeijos!
Júlia é uma menina sensível, como a mãe!
ResponderExcluirCreio que há tempo para tudo, ser feliz, sofrer, chorar, sentir a dor do luto, são etapas, ciclos desta vida tão boa de ser vivida.
Boa semana e eutimia.
Acho muito interessante esse tema. A vida é composta de felicidades e tristezas, nascimentos e lutos... e viver é participar de tudo isso. Se não existisse a tristeza, não existiria a felicidade, se não existisse a morte, não existiria a vida... é um ciclo que precisa ser vivido.
ResponderExcluirLi um post que trata disso na Folhinha e achei bem bacana, se quiser dar uma lida... Só acho que a autora poderia explorar um pouco mais o assunto:
http://cafune.blogfolha.uol.com.br/2013/04/09/historias-tristes/
Beijos!!!
Lívia.
Julinha tem uma percepção aguçada, o que aflora muito sua sensibilidade.
ResponderExcluirOs estágios do luto devem sim serem vividos cada qual a sua vez, pois ao haver um supressão,algo permanecerá inconcluso na emoção dos que ficaram.
Bjos, Ana.
Calu