sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Carta à professora


Carta à professora da minha filha

Cara Professora,

Eu comprei para a minha filha um daqueles bloquinhos para se escrever recados. Papel enfeitado e colorido. O dela tem aquela forma das bonequinhas japonesas, acho que se diz kokeshi.
Sabe professora, a primeira vez que eu vi um bloquinho desses, tive vontade de comprar, mas por algum motivo, eu comecei a pensar que se minha filha o tivesse na mãos, iria mandar recadinhos para as amigas e poderia atrapalhar a sua aula e ainda levar uma bronca.
Porém, dia desses, eu estava sozinha em casa e fui fazer uma faxina no quarto dela. Encontrei alguns, ou melhor, muitos desses papeizinhos. Larguei o pano e a vassoura de lado, sentei-me no chão e me pus a ler cada um deles.
Aquela letrinha de criança, aqueles erros ortográficos que passam a não importar porque ali tem tamanho carinho, tanta pureza. Ali é o coração que lê.
Professora, há quanto tempo que você não recebe de um amigo seu, adulto, um bilhetinho assim escrito “ti amo 100 vezes, você é minha melhor amiga ou você vai ser a minha melhor amiga para sempre e eu gosto de você 1000 vezes”? Há quanto tempo?
Há muito que eu não recebo um bilhete assim e ouso dizer que a senhora também não. Nós adultos, tão cheios de “achismos” iríamos achar que não fica bem dizer ti amo 100 vezes para um amigo ou amiga. Poderiam interpretar mal.
Falto-nos coragem. Temos vergonha em excesso e não sabemos usar o coração para ler bilhetinhos.
Já aconteceu professora, do copo de leite virar inteiro na blusa do uniforme bem na hora de sair e eu enfurecida, falando da falta de cuidado, falando que vamos chegar atrasadas enquanto procuro outra blusa no cesto de roupas para passar, fazê-la chorar e ela entrar para a sala de aula de blusa limpa e coração manchado de tristeza.
Eu me desculpei, disse que me descontrolei, mas sei que a tristeza foi com ela.
E agora também sei que ela receberá um bilhetinho assim: “Ju o que você tem? Toma lanche comigo oji?”
Esse papelzinho, dobradinho que vai passando de mão em mão vai abrandar a tristeza da minha menina e logo ela estará bem.
Foi pensando em tudo isto que eu deixei a faxina e fui para a loja comprar o bloquinho.
Orientei-a que só deveria mandar recadinhos quando você estivesse de costas para a sala, escrevendo na lousa por exemplo.
Mesmo que ela não tire dez na prova de matemática, tenho certeza que ela saberá o valor de um amigo que gosta da gente 100 vezes.
Desculpe professora por eu ter feito isto, mas é que quando a minha menina deixar de ser borboleta e se metamorfosear em adulto, não sei se ela conseguirá dizer “ti amo amiga, vem na minha casa oji?

Sem mais

mãe da Ju





17 comentários:

  1. Comovente terna e emocionante!!! LINDO!!! Sensibilidade pura! Verdades todas!!! Valeu!!! Quantas bobagens quantos xingões por besteiras... Isso é espontaneidade, amor limpo, inocente!

    beijos,chica

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  2. Pois é!
    Para se ensinar numa escola, trabalhar com crianças de uma maneira geral, penso que deveriam haver padrões altamente exigentes de acompanhamento e perfil adequado ao cargo.
    Educar dá trabalho, é uma teia, não é uma regra, norma, nem mesmo é um cargo.
    Todo educador é um formador de opinião e hj em dia temos que pegar as rédeas senão as opiniões e vivências de nosso filhos, sobrinhos, netos...são sistematizadas, empacotadas a vácuo e chanceladas com código de barras.
    Já ouvi tanta coisa como aluna, mãe e e professora e imagino tantas outras que casam certinho com a mensagem do filme A Professora muito Maluquinha de Ziraldo, vcs já viram?, tem o livro também ;]
    Vejam e mandem um bilhetinho para pró de Ju e para tdas as prós recomendando que leiam ou assistam, muitas não vão entender a mensagem, pq mensagens, filmes, músicas com lição de vida, valores, sentimentos, são assim, agente só entende se tem.

    PS: Quero um bilhetinho desses e um desenho tb.
    Criança não tem isso, pede mesmo :)

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  3. Ai que lindo Ana!!
    Até chorei. Voltei no tempo e lembrei de tantos bilhetinhos que troquei com minhas amigas. Alguns ainda tenho guardado, assim com esses erros ortográficos.
    Algumas dessas amigas continuaram minhas melhores amigas até hoje. E espero que a Júlia também carregue essas amizades para sempre.
    Um beijo e bom final de semana
    Paty

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  4. Hoje estou muito sensível...que você me fez horar..Flor

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  5. Terna e doce amiga!
    Estou aqui emocionada e refletindo...

    Tenho um convite para trabalhar como psicopedagoga na Educação infantil.(ainda não aceitei)
    Esse post tocou meu coração pois nesse trabalho poderei contribuir para que os professores possam dar mais atenção também a essas emoções sentidas pelas crianças.
    Amei te ler!
    Abraços! Um final de semana abençoado e feliz.

    Parabéns por seres uma mãe sábia e amorosa!

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  6. Dizer o quê Ana?! Vc me calou! E tenho certeza que calou a professora tbém! Emocionante demais! Bjoooosss

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  7. Ana,
    achei tudo tão lindo, tão lindo que estou parada aqui alguns minutos e não encontro nada para escrever.
    Essas letrinhas e sinceridades me encantam!
    E que muitos bilhetinhos e sorrisos aconteçam na vida da Júlia.

    Um final de semana feliz! :)

    Beijinhos,
    Carol
    Um blog simples
    Facebook
    Lojinha

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  8. Oi Ana, que maravilha de post! É bem verdade... Deixamos de "bilhetar" ... Ainda tenho alguns bilhetinhos que ganhei na época que dava aula. Tão singelos e sinceros bilhetinhos. Saudade!

    Que não falte bloquinhos para Júlia.

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  9. Que coisa linda Ana!! Saudade da infância. Apesar de muitas vezes escrever esses bilhetinhos "bobos" para amigas. Eu escrevo muitas vezes, com receio de entregar, de falar, de descrever o amor que sinto por uma amiga ou amigo no momento.
    Mas apesar disso, escrevo. :)

    Que sejamos meio bobos às vezes. Talvez assim, nossos corações nunca se tornem vazios.

    Beijos*

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  10. Oi AnaPaula
    É doce ,é lindo, é especial.
    Inocentes palavras que traduzem tão bem o coraçãozinho delas!
    Adoro ler essas coisinhas do cotidiano, voce sabe bem faze-las,sempre vou repetir ok?
    um beijo

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  11. Oi querida, voce me comoveu com esse texto.
    Sou muito sensível a essa maneira das crianças se declararem. Vem de uma forma tão expontânea que "quebra" a gente.
    Quem convive com netos como eu, sabe o valor de um "essa noite acordei e fiquei com saudade de voce vovó".
    Eles são mesmo especiais, e a gente (como humanos e imperfeitos) perde mesmo a paciência vez ou outra, mas o que importa é o sorriso, o carinho na hora certa, a mão que afaga.
    E eles sabem disso. E é isso que fica, esse carinho enorme que voce tem para dar, e essa deliciosa maneira de relatar e expor tanto amor.
    Parabéns Ana, adorei. Beijos

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  12. Ai Ana,me comoveu sua história!E como essa interação entre eles faz bem!Ainda guardo comigo tb bilhetinhos que recebia de alunos e desenhos que faziam pra mim.Dentro do armário da sala eu ia colando na porta os desenhos que eles faziam,fotos...era muito legal!Adorei seu texto!bjs e bom sábado!

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  13. Ai que post mais fofo! Que coisa mais linda! Não há coisa melhor do que a pureza e a sinceridade de uma criança... A quanto tempo não recebo um bibletinho desses? Acho que uns 10 anos...
    Mais eu tenho até [oji] os bibletinhos que ganhei das minhas amiguinhas de infância... Quanta saudades!!

    Beeeijos

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  14. Não temos o direito de deixar morrer a criança que persiste em querer viver por dentro de nós!!
    Deixemos que ela possa sorrir, que isso nos fará, de certeza, melhores pessoas... e bem mais felizes!
    Beijinhos Ana Paula,

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  15. Vale chorar? Que texto lindo, me fez lembrar uma época cheia de bilhetinhos, caderno de recordações, confidências e me perguntei quando isso deixou de existir? Não sei como são os meninos, logo irei descobrir! Fase mágica, linda, ponto pro bloquinho e pra sua sensibilidade de perceber a importância desse momento. Bjo grandeeeeeeeeeeeeeeeee

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  16. Tenho tanta saudade dessa epoca que agora eu chorei :(
    E fiquei pensando no quanto passar pelo processo de metamorfose nos anestesia para a vida.
    Que linda sua filha que cativa e cuida dos amigos.
    Abracos
    Gra'

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  17. Ana Paula, que postagem linda! Isso me leva a propor uma campanha para que nós, os "metamorfoseados", nos tornemos mais puros e usemos com muita força no coração esse sentimento amoroso meio amortecido entre nós. Somos tão responsáveis e preocupados que perdemos o melhor da vida. Perdemos o amai-vos uns aos outros. Se continuarmos assim, seria interessante comprarmos aquela geladeira que escreve bilhetes, com todo o respeito à dedicação refrigerada do Seu Zé da Geladeira.
    Ana, achei muito importante essa experiência que você nos passa:
    ela (Júlia) entrar para a sala de aula de blusa limpa e coração manchado de tristeza..
    Quantas vezes "erramos" em nome do asseio e dos bons modos. Valeu o seu ensinamento.
    Beijo
    Manoel

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