Devido
ao horário avançado ( opinião pessoal ) apenas afasto a cortina e
espio pela janela entreaberta.
O
sujeito pronuncia palavras e eu respondo indelicadezas. Apesar de,
levanto-me e vou até ele.
“A
senhora me desculpa por eu estar atrapalhando a tua novela".
Começamos
mal, muito mal...
Que
mania é esta de, só porque são nove horas da noite, achar que eu
estou assistindo à novela das nove?
Mais
indelicadezas da minha parte.
“Eu
moro na rua detrás – prossegue ele meio sem jeito – e como a
senhora já deve ter percebido, estamos tendo muitos problemas com
esta praça ( a que fica defronte à minha casa ), lixo, drogas,
assaltos.
É,
é bem verdade.
Uma
reunião com os moradores das duas ruas para discutirmos sobre as providências necessárias. Ele e sua família estavam cedendo a casa
deles para essa reunião e gostaria de contar com a nossa presença.
Achei
pertinente o tema. Achei delicado confirmar presença.
“Quarta,
as dezenove, no número 150, casa azul!”
Falei
com o marido, que achou importante que participássemos. Ele ficaria
em casa com as crianças para eu ir.
Tenho
pensado em algumas escolhas do marido: na hora do mercado, ele sempre
escolhe tirar as compras do carrinho e eu empacotar.
Cheguei
no horário. Subi uma escada em caracol, fui conduzida a um terraço,
onde algumas pessoas já aguardavam sentadas diante de uma grande
mesa retangular.
Sentei-me,
apreciei o local. Havia uma piscina. A conversa fluía sobre quando
eram crianças e brincavam por aquelas ruas. Fui me sentindo um peixe
fora d'água porque moro ali há somente oito meses. Senti vontade de
entrar na piscina, mas aí chegou um sujeito que me chamou muito a
atenção.
Ele
utilizava uma muleta. Apenas uma. Subiu a escada caracol sem
demonstrar dificuldade. Depois andou agilmente, porém sempre
segurando a muleta que parecia flutuar no ar e distribuiu jornais
para todos os que ali estavam. Acho que aquilo era realmente só uma
muleta. No sentido psicológico da palavra.
Outra
movimentação e surgiu uma tela na nossa frente.
Documentário
e ficção.
Olho
para o jornal e minha atenção é desviada quando surge na escada
caracol uma figura muito lustrosa.
E
não é que era o mesmo homem do jornal?! Impressionante...
Voltei
os olhos para o jornal – propaganda política.
Marido
pressentiu isto e por isso escolheu cuidar das crianças.
O
bem mais precioso que nós temos, não são os patrimônios, somos
nós, pessoas.
Já
gostei do sujeito. Um cara que valoriza o ser humano.
Era
secretário de segurança, afastado para poder se dedicar à
campanha.
Menino,
cresceu brincando por aquelas ruas junto ao meu anfitrião. Lembrou
que havia uma jabuticabeira bem ali.
Senti
novamente vontade de ficar na piscina.
Mas
ele estava ali para nos ajudar. Era somente preciso ajudá-lo a
vencer as eleições.
Falaram
do problema das drogas.
Eu
disse que todas as manhãs via jovens da escola próxima dali,
deixando de ir para a escola para se drogar. E indaguei se ele não
poderia colocar uma ronda escolar.
“Sabe
porque não posso? Porque aquela escola é do estado. A ronda deve
ser feita pelo estado e não pelo município”.
Achei
confuso raciocinar, afinal ele não tinha dito que o ser humano era o
mais importante?
Então,
depois que saímos do cinema, da leitura dramática, entramos no
assunto moda.
Ele
falava da belíssima confecção de uniformes que o nosso prefeito
fazia ( e eu nem sabia que ele era alfaiate ) e disse que o
governador nem se importava com isso...
Ficou
bastante tempo na moda. Voltou depois falando da tecnologia. Se
eleito for, colocará câmeras na nossa praça, polícia inteligente
( não consegui entender isso ), mas para isso ele precisa ser eleito
vereador para que o prefeito o puxe novamente ao cargo de secretário.
Aí
ficou confuso para mim: ele precisa ganhar para vereador e o outro
sujeito precisa ganhar para prefeito? É isso mesmo?
E
se ele ganhar e o prefeito não? Vão puxá-lo para onde? E como fica
a câmera de segurança se um vencer e o outro não?
Achei
melhor parar de pensar e utilizar o serviço de restaurante
disponível a minha frente.
Muito
saboroso. Servi-me de bolo de cenoura com coca-cola. Não é uma
crítica, porque realmente estava gostoso. Mas, se fosse eu, se fosse
na minha casa, eu serviria coca-cola com pizza. Acho que combina mais
com a ocasião.
Distraí-me
tanto no restaurante, que quando voltei, um sujeito da plateia
reclamava dos hidrômetros que foram substituídos e agora as contas
vem volumosas.
Nosso
protagonista disse viver o mesmo problema. Sua conta de água vem tão
alta que ele acha que quando sai para o trabalho, o amante de sua
mulher deve ficar o dia todo com o chuveiro ligado.
Quase
caí da cadeira de tanto que ri. Que humor. Que talento. Ri tanto que
não escutei a resposta para tal problema.
Comecei
a pensar nas oficinas, nos cursos de escrita criativa que eu tenho
vontade de fazer e acho que devo mudar de opinião e fazer um curso
de político.
Não
existe sujeito mais criativo que um político.
Pensei
em perguntar sobre qual solução ele daria para o preço do tomate.
Como está caro o tomate. Como eu não sabia se deveria abordar a
secretaria do abastecimento ou da agricultura, modifiquei a pergunta.
“Então
se eu entendi, o senhor colocará uma ronda a partir de amanhã e se
ganhar, o que é certo, teremos então, a câmera, a inteligência...?”
Correto,
respondeu-me o ilustre.
Bom
eu já vou indo, disse. E ele também porque ainda tinha outra
reunião.
Apertou
minha mão dizendo que contaria com meu apoio para que possamos andar
pela praça como nos tempos das jabuticabas.
E
enquanto eu apertava a mão dele, lembrei-me que eu não transferi
meu título de eleitor. Não poderei votar nele, nem no sujeito que
vai puxá-lo.
Da
próxima vez no mercado, eu tiro as compras do carrinho e marido
empacota.
rssssss...Que FRIA essas "reuniões de vizinhos"...
ResponderExcluirNão dá pra querer misturar política nesses papos,não é? E depois de aguentar tudo, a constatação de que nem ao menos podes votar nele,rsrs
Muito bem contado!! beijos,chica ( e o maridão é vivo!!)
Eu ia comentar mas decidi não falar nada, é melhor :)
ResponderExcluirUm fds de ação, nenhuma enrolação e muito amor :)
Os tomates estão caros mesmo, eu hoje reclamei disso na feira do agricultor. Disseram que é culpa da estação.
ResponderExcluirPoliticagem é uma porcaria mesmo né? Prometem e só fazem "se" [e geralmente nem fazem]. E enquanto não tem a polícia inteligente, o jeito é ir usando a polícia burra por ai.
Gostei da crônica Ana Paula e da tirada do amante.
beijokas doces e um bom domingo.
Olha, que situação difícil...
ResponderExcluirBjs e te desejo uma linda semana e muitas realizações.
CamomilaRosa
Pois... aí como cá, sempre as mesmas tácticas eleitoralistas!
ResponderExcluirEles já nem imaginação têm!!
beijinhos,
Ana,isso é que é entrar numa roubada!Reunião falando de política ninguem merece,ainda mais pedindo voto!Me poupe!...rss...adorei e ri muito com sua história!bjs e meu carinho,
ResponderExcluirAna, como seu jeito de escrever prende do início ao fim... ri com você e pensei... "que fria essa reunião", por outro lado você pôde constatar coisas que no fundo já sabia, como por exemplo que coca cola combina mais com pizza, embora eu não rejeite jamis um bolo de cenoura (meu predileto)...
ResponderExcluirVocê é hilária na sua sutileza... Me fez pensar aqui: marido também me faz empacotar as compras enquanto ele as tira do carrinho...rs preciso rever isso!
Beijos menina, adorei!
E saiba que você me emocionou com seu comentário por lá... lembrei também da sacola de lona...
Su.
Nossa que fria rsrs...
ResponderExcluirOdeio isso, porque pensamos que a coisa é seria, e quando vemos e coisa politica...
E para dar raiva hahaha...
Bjs
Que massa! Adorei a sua crônica, digo, aventura, digo reunião de vizinhos, rsrsrsrs Que saudade, Ana Paula! Adoro vir, voltar aqui. Beijos! Passa lá no blog!
ResponderExcluirOii Ana, acho que essa reunião foi uma roubada, kkkk, já estive em uma reunião assim em casa p ouvir candidatos, e acabei votando no sujeito mesmo, e ele até que foi bom bjooosss!
ResponderExcluirAi Ana.....vc escreve tão bem que me transportei na reunião com você....essas questões politicas são cansativas e complicadas....o marido aqui em casa também tira as compras e eu empacoto....vou mudar as coisas por aqui ....beijos
ResponderExcluirAqui no meu condominio tb tivemos problemas parecidos. Alguns meninos se meteram com drogas. Obrigada por responder à chamada da blogagem, vai muito legal ter sua companhia!
ResponderExcluirAna estou rindo do final de seu post, marido é assim mesmo, na hora do aperto a gente que tem que enfrentar estas coisas chatas. Tudo é muito lindo na hora do discurso, mas será que vai cumprir tudo direitinho, ai que esta a questão.
ResponderExcluirAdorei sua narrativa, você tem um jeito bem divertido de escrever, encanta. Beijinhos.
Haha tem um igualzinho aqui na vizinhança! É super simpático antes das eleições e por duas vezes o povo votou. Não votam mais, porque depois de eleito a simpatia vai para o ralo! :)
ResponderExcluirSobre a escola ser do Estado e os alunos na praça? A praça pertence ao município e drogas é caso de polícia. Todas as escolas estão instruídas a chamarem polícias para darem batidas em suas instalações. Não o fazem por causa da evasão escolar. Se esse político colocar policiamento na praça, perderá votos. Já pensou o número de eleitores por detrás dos menores apreendidos, incluindo os traficantes. Traficantes nas comunidades rendem muitos votos.
Boa semana!! Beijus,
Quer fazer um bom curso de estratégia de mkt? é só acompanhar a campanha política...
ResponderExcluirBoa semana! bjs
Leila
Ana Paula,
ResponderExcluirna próxima vez a reunião poderia ser mesmo em uma pizzaria... facilitaria.
Vergonhoso! Lamentável!
Carol
www.umblogsimples.com
Oi AnaPaula
ResponderExcluirUma beleza de texto!
Cheguei a rir bastante da ironia fina, do jeito moleque de falar do assunto _política.
E como essas reuniões despertam detalhes, que descreveu mesmo nas entrelinhas.
Adorei Ana, voce é craque_ nota dez por nao ter transferido o título
kkkk
adorável essa noite...
um abraço