domingo, 12 de agosto de 2012

O pai do sertão



O pai lança um olhar demorado para o céu.
Não se sabe se agradece, pede, suplica, ou o mais provável é que simplesmente constate o que aprendeu menino, enxergando nos olhos no próprio pai.
A desolação da seca, o deserto nas suas terras, as carcaças espalhadas, os filhos lá dentro do casebre.
Talvez um esboço de lágrima nos seus olhos, talvez só a aridez da vida.
Chama a mulher: arruma a trouxa pra menina.
E num virar de página, ela está num outro extremo de seu próprio país.
É a voz firme da madre superiora que as define:
Chegam aqui assim, sem saber fazer a própria higiene, sem saber segurar talher. É um longo trabalho de entalhe até chegar no ponto de encontrar ou não a vocação. A maioria traz apenas a esperança de fugir da seca. Os pais almejam a vocação para as meninas não voltarem, mas nem sempre é assim."
Meus olhos cruzam com os dela por alguns instantes. O suficiente para perceber que seu coração está imundado. Tanta água como ela nunca viu.”Tão difícil, de repente, ter tanta água em si.
Outras tantas páginas viradas, e num entra e sai do trem, vejo entrar e acomodar-se junto a uma janela, uma jovem “irmãzinha”.
Fico a olhar sua face, emoldurada por um hábito, e entre o fechar da porta e aumento da velocidade do trem, tive a certeza de ver uma flor nascida em meio à terra rachada do seu coração.

13 comentários:

  1. Oi Ana... Belo texto!

    Bom restinho de domingo prá você e sua família linda.


    Bj

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  2. Emocionante, como sempre e lindo!!beijos,tudo de bom, chica

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  3. Querida amiga!
    Amei ler esse texto!
    Lindo, reflexivo, emocionante,
    prendeu minha atenção e levou-me a imaginar as cenas... Parabéns!
    Abraços! Uma semana abençoada e feliz pra ti.

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  4. Há muito tempo eu li Morte e Vida Severina de João Cabral de Melo. O seu texto maravilhoso, por algum motivo me fez lembrar a historia do livro. Qual a semelhança? A luta pela sobrevivência!
    Quantas Marias e Severinos, quantas decisões difíceis a serem tomadas por pais do sertão. Quanto sofrimento! Caminhos diferentes e corações sempre juntos, alguns com sentimento de perdão, outros de mágoas, e assim cada um segue suas vidas.
    "(...) E não há melhor resposta que o espetáculo da vida..." Alguns, com finais felizes!

    Lindo, maravilhoso texto!

    Beijos Ana!

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  5. Bonito sentimento de um pai que precisa por força dos embates da vida entregar os filhos a outros mesmo que esses outros sejam os melhores pais do mundo.
    Gostei do conto AnaPaula
    e estive lendo os textos anteriores _ ri bastante das suas 'Considerações' _ótimas! rs

    *nem sempre consigo acompanhar os blogs em tempo mais 'real' _ acaba que fica tudo mais no virtual mesmo rs
    abraços, boa semana

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  6. Lindo texto Ana Paula.


    filhadejose.blogspot.com
    @filhadejose

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  7. Ana,um conto genail,muito profundo!Adorei,li e reli!Bjs e boa semana!

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  8. Boa tarde, Ana Paula. Conhecendo o seu blog hoje e dando uma pincelada em seus textos.
    Esse, deixou-me emocionada pela dura realidade e o sacrifício dos pais em ter de abrir mão do que mais amam, mas é justamente por esse amor, que o fazem.
    Beijos na alma e fique na paz!

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  9. Oii Ana, imagino a dor de um pai que vê seu filho passar fome e sede nas secas do sertão, imagino o conflito de sentimentos de quem deixa o sofrimento p trás e passa conviver com uma realidade infinitamente diferente! Gostei muito, adoro a forma como escreve Ana! Bjooooooosss

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  10. Que lindo Ana,

    Ainda bem que este pai procurou um lugar melhor. Ainda há muitos pais que entregam suas filhas nos prostíbulos e ganham um bom percentual pela virgindade delas. Uma triste realidade.

    Lindo texto!

    Beijos

    Leila

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  11. Amei seus comentários de hj...como os de sempre

    Tentei participar das 77 palavras mas ando sem tempo e coma cabeça cheia, vim só salpicar água de cheiro com raminho de folhas de pitangueira \o/

    Bjos nas crianças e cafuné no dog :)

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