sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Véspera


O dia amanheceu véspera. O canto dos passarinhos era um canto de véspera. A banana que meu marido ofertou-lhes era véspera.

Véspera. Como foi mesmo que aprendi esse conceito?

No dicionário a definição vem como o dia que antecede.

Lembro-me da professora dos anos iniciais que carinhosamente podíamos chamar de tia, ensinando-nos o que era véspera - " véspera de quinta-feira é? quarta-feira, respondíamos em coro; véspera do dia 19 é? dia 18.

Certamente foi em casa que a palavra véspera tinha seus significados ampliados. Na véspera de algum aniversário de criança da família, lá estavam as tias enrolando brigadeiros, línguas-de-sogra, cajuzinho, as balas de côco que eram enroladas em papéis coloridos com franjas e nada podia ser comido porque era véspera.

O mesmo se dava no Natal, a véspera dos adultos era cheia de afazeres na cozinha, era uma véspera inundada de cheiros, de aromas ora doce, ora salgado.

Algum adulto colocava presentes debaixo do pinheiro que espetava e estava decorado com pequenos pedaços de algodão, nossa neve, e nossas mãozinhas de criança, olhos curiosos, alertados que em nada podíamos mexer, afinal era véspera.

Véspera era um dia comprido, custoso de passar. A palavra véspera talvez afetasse os ponteiros do relógio e eles passavam a fazer o seu tic-tac de modo moroso, quase arrastado.

Outro problema que nos acometia nas vésperas, além dos ponteiros se moverem com lentidão se dava na hora de dormir. Um coletivo de borboletas ( que acabei de pesquisar - panapaná, panapanã ) invadia os olhos, os pensamentos, a barriga toda e chacoalhava o sono que assustado ficava,  escondia-se sabe-se lá onde...

Assim também foi a véspera da minha última quimioterapia.

Acordei numa mistura de sentimentos - a alegria por chegar ao final, o desejo de que já fosse o dia e não a véspera e, o que na minha infância acontecia com os ponteiros de qualquer relógio, aconteceu com qualquer relógio digital que eu olhasse, tudo absolutamente lento.

Seria um dia comprido. Foi realmente um dia que não passava para logo trazer o que a minha véspera significava.

Claro que meu conceito de véspera na vida adulta não envolve só olhinhos curiosos, borboletas na barriga.

Bem sabemos que há vésperas que são difíceis, dolorosas, vésperas que machucam.

Mas a minha véspera era feliz.

Dia 5 de dezembro de 2024, às 16h eu estava recebendo a última sessão de quimioterapia.

O corpo também é moroso para se recuperar de uma medicação tão agressiva. Passei pelo mais difícil, foram 16 químios entre vermelhas e brancas. Agora lido com um efeito colateral bastante desagradável, tenho algumas unhas que estão a cair. Traz bastante incômodo mas pensar em tanto que enfrentei nessa jornada me faz inspirar profundamente e dizer isso também vai passar.

Toda essa história de véspera é para dizer que estou bem e quero agradecer a cada um de vocês, amigos de blogs que rezaram por mim, que me colocaram em suas preces, que me enviaram um pensamento carregado de força e muita vibração positiva.

A gente nem sabe explicar, e realmente não precisa de explicação nenhuma, cada pensamento, cada oração de maneira misteriosa me chegou, me sustentou e eu realmente agradeço.

Seja o seu Natal envolto em amor!

E mais uma vez, obrigada por estar ao meu lado desejando-me força 💚