quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Vou reformar


Vou reformar a minha sala.
É bem verdade que acabei de reformá-la antes da mudança, está tudo novo, bonito, de acordo com os padrões das revistas especializadas que dizem como deve ser a nossa própria casa, está tudo moderno, está tudo arrumado.
Mesmo assim eu vou reformar – quebrar, desarrumar, desorganizar, sujar.
Vou reformar o comodismo a que os meus olhos se acostumaram antes que as imagens que me adentram a retina se infiltrem em minha alma.
É tão confortável a disposição da minha sala: ali senta-se e se impõe um silêncio para que fale a grande rede televisiva, ali não se sorri porque é hora do jornal em rede nacional e sorrisos não combinam com as vozes taciturnas dos apresentadores e suas notícias deprimentes.
A areia com a qual foram construídas as paredes se transformaram em ampulhetas invisíveis do tempo que sussurram incessantemente aos meus ouvidos e conseguem impregnar meus músculos dizendo que o lazer começa só na sexta-feira após as 20h e termina por volta do domingo às 17h. Mas nesses dias de lazer o grande retângulo luminoso de diversão não desperta gargalhadas em mim; hipnotiza-me de forma tal que fico ali aprisionada enquanto escorre a areia do tempo e chega a segunda-feira. E eu fico esperando a voz do locutor quase gritar “Graças a Deus hoje é sexta-feira”.
Então Deus prefere sexta, sábado, domingo? Mas e a garotinha que morreu no sábado?
Deus não estava feliz? E nos dias corriqueiros, ele está de mau humor e deixa o mundo ao deus dará?
Basta.
Não determinarão o dia em que eu deva sorrir.
Vou impregnar minha retina das imagens que eu escolher, outras vou me deixar surpreender.
Meus ouvidos se encherão de vozes de crianças – sempre há crianças – sobrinho, neto, vizinho... Quero aquela vozinha que vai despertar meus músculos, meu riso fácil.
Divertir-se em qualquer momento. O calendário só para os compromissos. Vou sentir o que quero fazer em cada dia. Vou faxinar no domingo e brincar e relaxar num outro dia qualquer.
Vou reformar a sala porque meu coração vive além de imposições.



segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Fábrica lunar de travesseiros


Nossas crianças urbanas, tão desenvoltas perante a tecnologia, crescem, muitas vezes achando que a vaca bota leite empacotado em caixinhas, que o bombom nasce pendurado na árvore cacau ( que show ) e por aí vai.
Problema este que tem sido minimizado por gente visionária no mundo dos negócios, que tão apropriadamente criou as "fazendinhas urbanas".
Espaços dentro das grandes cidades que contém uma vaca, meia dúzia de galinhas e duas ou três ovelhas. O suficiente para que nossas crianças possam passar uma tarde agradável, mediante uma boa quantia como pagamento, geralmente levados pelas suas escolas.
E nós, pais, ficamos orgulhosos por nossos filhotes poderem aprender que suas luvas de lã, usadas no inverno, saíram lá da ovelhinha.
Aqui em São Paulo também há casas de festas infantis nesta linha - vamos buscar os ovos no galinheiro para fazer cup cakes - sucesso absoluto!
Temos que agradecer a essas pessoas que sabem como tirar leite de pedra e salvam nossos filhos do analfabetismo natural ( de natureza ).
Mas agora estamos diante de novo desafio - os travesseiros.
Sim, aqueles que embalam nossos sonhos enquanto mamãe nos lê uma bela historinha com final feliz.
O que fizeram com nossos travesseiros?
Algumas imagens para entendermos a situação:








Estamos sendo induzidos a acreditar que os travesseiros são fabricados na Lua. Deve haver uma fábrica  lunar de travesseiros!
E agora, como nos salvar?

Toda essa brincadeira é porque há tempos eu queria falar do meu travesseiro de paina.
Ficou comigo até poucos anos atrás. Era figurativo apenas. Intensamente rico em sentimentos - ali chorei a morte dos meus pais, devaneei com o príncipe encantado, tracei metas, objetivos, dei muitas gargalhadas.
Todos os anos uma tia, sabendo que eu não queria me desfazer de tal relíquia, abria o ninho de sentimentos, espalhava a paina já amarelada e empelotada numa bacia de alumínio para que pegasse sol e costurava nova capa para ele.
Pronto! sonhos renovados.
Dia desses encontrei um poema sobre paina e ontem queria encontrar imagens para ilustrar esse post, mas aconteceu melhor!
Conheci um blog encantador, que tem uma postagem inteira sobre os travesseiros de paina! Pura poesia!

O poema de Henriqueta Lisboa, que aproveito para dedicar à dona do blog "Meu cantinho na Roça"

Paineira

Paineira boa
do meu quintal
piso-te as flores
tu me dás paina

Todos os anos
as flores perdes
para que eu pise
róseos tapetes

Meu travesseiro
sempre macio
cada janeiro
tem nova paina

Paina, carícia
do meu remanso

Flores, prenúncio
de céus vindouros

Paineira bela
dos meus amores!

Gostou? Então agora vamos lá conhecer a paineira, ver o fogão a lenha, a passarinhada, o cheiro de mato. Vem por aqui!

domingo, 19 de fevereiro de 2012

O banho da menina




Asseada que é
um banho
a menininha queria tomar
não tinha porém
com o que se esfregar

Ao papai pediu
que fosse correndo
na farmácia comprar
uma bucha
para se esfregar

Três dias o papai demorou
e a menininha esperou
seu banho tomou
mas não esfregou

A menininha admirou
foi do tamanho da bucha
que o papai comprou
e os olhos arregalou

Em qual farmácia
uma bucha deste tamanho
você encontrou?



Comprei não
menininha do meu coração!
Corri foi pra fazenda da vovó
onde a cerca parecia uma bucha só!

Bucha, semente tem,
meu coração
a gente planta na fazenda
no sítio ou no sertão

Lá no cantinho quietinho
da tua avó
ela plantou, cuidou, colheu
e com carinho te enviou
para seu banho quentinho
cheirosinho
e bem esfregadinho!


A pérola da ostra


Confesso que não sei quem é Rubem Alves. Leio frases, pensamentos dele em vários blogs queridos e faço algumas buscas pela internet para saber mais desta personalidade, deste ser humano tão intrigante.
Vou juntando aqui e ali, mas sempre com a sensação de que falta-me aprender e apreender mais sobe ele.
Contador de histórias, escritor, intelectual, dono de um restaurante... e são tantas as suas faces.
Escrevi sobre ele porque muitos dos que lêem este blog poderão me ajudar, acrescentar, conhecê-lo um pouco mais.
Um texto e um vídeo de Rubem Alves
Beijos


Ostras são moluscos, animais sem esqueleto, macias , que representam as delícias dos gastrônomos. Podem ser comidas cruas, com pingos de limão, com arroz, paellas, sopas. Sem defesas – são animais mansos - , seriam uma presa fácil dos predadores. Para que isso não acontecesse, a sua sabedoria as ensinou a fazer casas, conchas duras, dentro das quais vivem.
Pois havia num fundo de mar uma colônia de ostras, muitas ostras. Eram ostras felizes. Sabia-se que eram ostras felizes porque dentro de suas conchas saía uma delicada melodia, música aquática, como se fosse um canto gregoriano, todas cantando a mesma música. Com uma exceção: de uma ostra solitária que fazia um solo solitário. Diferente da alegre música aquática, ela cantava um canto muito triste. As ostras felizes se riam dela e diziam: “Ela não sai da sua depressão...”. Não era depressão. Era dor. Pois um grão de areia havia entrado dentro da sua carne e doía, doía, doía. E ela não tinha jeito de se livrar dele, o grão de areia. Mas era possível livrar-se da dor. O seu corpo sabia que, para se livrar da dor que o grão de areia lhe provocava, em virtude de suas aspereza, arestas e pontas, bastava envolvê-lo com uma substância lisa, brilhante e redonda.
Assim, enquanto cantava seu canto triste, o seu corpo fazia o trabalho – por causa da dor que o grão de areia lhe causava. Um dia, passou por ali um pescador com o seu barco. Lançou a rede e toda a colônia de ostras, inclusive a sofredora, foi pescada. O pescador se alegrou, levou-as para casa e sua mulher fez uma deliciosa sopa de ostras. Deliciando-se com as ostras, de repente seus dentes bateram num objeto duro que estava dentro de uma ostra. Ele o tomou nos dedos e sorriu de felicidade: era uma pérola, uma linda pérola. Apenas a ostra sofredora fizera uma pérola. Ele a tomou e deu-a de presente para a sua esposa.
Isso é verdade para as ostras. E é verdade para os seres humanos. No seu ensaio sobre O nascimento da tragédia grega a partir do espírito da música, Nietzsche observou que os gregos, por oposição aos cristãos, levavam a tragédia a sério. Tragédia era tragédia. Não existia para eles, como existia para os cristãos, um céu onde a tragédia seria transformada em comédia. Ele se perguntou então das razões por que os gregos, sendo dominados por este sentimento trágico da vida, não sucumbiram ao pessimismo. A resposta que encontrou foi a mesma da ostra que faz uma pérola: eles não se entregaram ao pessimismo porque foram capazes de transformar tragédia em beleza. A beleza não elimina a tragédia, mas a torna suportável. A felicidade é um dom que deve ser simplesmente gozado. Ela se basta. Mas ela não cria. Não produz pérolas. São os que sofrem que produzem a beleza, para parar de sofrer. Esses são os artistas.
Beethoven – como é possível que um homem completamente surdo, no fim da vida, tenha produzido uma obra que canta a alegria? Van Gogh, Cecília Meireles, Fernando Pessoa...

do livro Ostra feliz não faz pérola ed. Planeta


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Sou uma princesa



Sim, é isto mesmo o que diz no título.
Sou uma princesa.
Ainda não me acostumei; tudo foi tão repentino, inesperado.
Quatro décadas vivendo como plebeia, e agora, assim: da noite para o dia tornei-me princesa.
Como sei que sou uma princesa?
Lembram-se daquela história na qual uma jovem ensopada de chuva dorme na casa de um príncipe e a mãe dele coloca um grão de ervilha debaixo de vinte colchões e a moça amanhece toda dolorida, com olheiras por sentir que algo a incomodou a noite toda e então é revelada uma princesa?
Então. Aconteceu comigo.
Não exatamente que eu dormi sobre vinte colchões, mas foi assim:
No alvorecer, tive meu primeiro diálogo real:
  • Oh querida! Que sono intranquilo tiveste.
  • Oh querido! Terrivelmente mal.
  • O que aconteceste, amada minha?
  • Amado meu, algo no travesseiro importunou-me por toda a noite.
Abrimos a janela, eu coloquei a mão por dentro da fronha e lá estava ela.
Bem, não era uma ervilha. Era um par de meias embolado e eu com uma sensibilidade que só uma princesa teria, senti-me terrivelmente incomodada.
  • Oh querida! Tu és uma princesa. Somente uma princesa perceberia com sua sensibilidade algo assim por dentro de uma fronha. Estou emocionado. Minha princesa!
Abraçamos-nos, saímos cavalgando pelos jardins do palácio e foi assim que da noite para o dia eu me tornei princesa.



Cachorro safado. Ontem à tarde eu estava esparramada na cama quando ele pulou para junto de mim com uma meia embolada na boca.
Vendo a situação, que representava risco dos mais elevados para o cachorro, apressei-me em salvar-lhe o pelo e enfiei a bolota de meia dentro da fronha.
Pegue qualquer meia, eu lhe disse, mas nunca as meias de quem lhe compra ração especial para pelos brilhantes.
Esqueci as meias lá dentro e tive uma noite horrível. Virava, mexia, remexia e não me ajeitava com o travesseiro, aquela ervilha gigante me incomodando e eu, em nenhum momento me lembrei do que poderia ser.
Acordei de mau humor, com dor no pescoço, olheiras... mas acordei princesa!
Desculpem-me pelas más palavras. Imagino que uma princesa não deva se expressar dessa maneira, mas como disse, tudo ainda é muito recente para mim. Preciso me acostumar a essa nova maneira de viver.
Com licença que preciso comprar chá. Nem importa o calor que está fazendo. Princesas bebem chá.
Também não sei se princesas devem ter blogs.
Enfim...

( Ivani como será que princesa fala fronha?)

A princesa e a ervilhaHans Christian Andersen
Havia uma vez um príncipe que queria se casar com uma princesa, mas não se contentava com uma princesa que não fosse de verdade. De modo que se dedicou a procurá-la no mundo inteiro, ainda que inutilmente, pois todas que via apresentavam algum defeito. Princesas havia muitas, porém não podia ter certeza, ja que sempre havia nelas algo que não estava bem. Assim, regressou ao seu reino cheio de sentimento, pois desejava muito uma princesa verdadeira! Certa noite, caiu uma tempestade horrível. Trovejava e chovia a cântaros. De repente, bateram à porta do castelo, e o rei foi pessoalmente abrir. No umbral havia uma princesa. Mas, Santo Céu, como havia ficado com o tempo e a chuva! A água escorria por seu cabelo e roupas, seu sapato estava desmanchando. Apesar disso, ela insistia que era uma princesa real e verdadeira. “Bom, isso vamos saber logo”, pensou a rainha velha. E, sem dizer uma palavra, foi ao quarto, tirou toda a roupa de cama e colocou uma ervilha no estrado, em seguida colocou vinte colchões sobre a ervilha, e sobre eles vinte almofadas feitas com as plumas mais suaves que se pode imaginar. Ali teria que dormir toda a noite a princesa. Na manhã seguinte, perguntaram-lhe como tinha dormido. -Oh, terrivelmente mal! – disse a princesa. Não consegui fechar os olhos toda a noite. Vá se saber o que havia nessa cama! Encostei-me em algo tão duro que amanheci cheia de dores. Foi horrível! Ouvindo isso, todos compreenderam que se tratava de uma verdadeira princesa, ja que havia sentido a ervilha através dos vinte colchões e vinte almofadões. Só uma princesa podia ter uma pele tão delicada. E assim o príncipe casou com ela, seguro que sua era uma princesa completa. A ervilha foi enviada a um museu onde pode ser vista, a não ser que alguém a tenha roubado.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Vamos lá?


Vamos lá? Entra aí que cabe!

Peço desculpas por estar tão embaraçada estes dias: não consegui participar da blogagem coletiva sobre o amor, não consegui colocar o link no dia que escrevi no blog Folhetim Utopia.
Então vamos lá, sobe aí no trem!

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Projeto 10 on 10 de fevereiro

Que cheiro bom!
Despertar com café do meu bem!


Observando o lindo amanhecer


Com o cacho ainda verde de banana


Ainda não me decidi se o que estragam e desfeiam 
as nossas cidades
são os pombos ou os fios.
Prefiro acreditar que os fios são pautas musicas
para uma bela sinfonia.


Deixando os pensamentos confusos de lado
vamos espairecer


E não importa o tamanho.
Biblioteca sempre é bom!


Olha só a carinha feliz da Júlia!


Acho que teremos mel de chocolate
ou será sabor brigadeiro?


E teve cachorro mansinho...


E cachorro muito feroz!



Venha participar do próximo 10 on 10!
É uma delícia
(mesmo que você ruim de fotos como eu!)


Mais participações:
Ale
Carol
Ana Virgínia
Adriana


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Buraco negro



Antes da questão do buraco negro gostaria de deixar alguns lembretes.
  • amanhã, dia 10, tem o projeto 10 on 10 da Mirys; preparem os celulares, as câmeras, carreguem as baterias e vamos clicar!
  • Domingo, dia 12, tem blogagem coletiva organizada pela Aleska sobre o amor; vale amor de pai, de filho, platônico, sofrido, vivido em poesia, prosa, conto, música. Vamos agitar o domingo que anda meio dorminhoco na blogosfera! O selinho é este:


E aos amigo que me perguntaram está o processo judicial dos meus filhos com a Secretaria de Educação de São Paulo, respondo que está “em andamento”. Conseguimos a liminar que permite que as crianças deem sequencia aos estudos e aguardamos o julgamento da mesma. Também levamos o processo para o Conselho Estadual de Educação; lá se encontra com uma relatora. Temos que esperar. Obrigada pela atenção. Escrevo mais sobre esse assunto num outro blog.

E vamos ao buraco negro.

Não pensem que farei uma dissertação extensa sobre a mais recente descoberta da Física sobre buraco negro.
Mantenho-me a anos-luz de distância de tal ramo da ciência.
Abrirei um parênteses aqui apenas para dizer que já gravitei em torno de tal assunto na infância. Lembrei-me deste fato porque ontem vi no mercado, dentro de uma enorme caixa de livros doados, um exemplar, capa vermelha do “O Colapso do Universo”.
Ganhei este livro do meu pai quando tinha uns oito anos. Não me lembro o motivo pelo qual ele apareceu com este título lá em casa. Será que imaginou que eu tinha algum talento para trabalhar na NASA? Coitado! Equívoco astronômico.

Voltando ao buraco negro.
Nós seres humanos ( permitam-me neste texto usar a generalização, embora não goste e não concorde com ela) somos seres engraçados.
Queríamos liberdade na cozinha, criamos os alimentos industrializados, fast food e agora sofremos com sobrepeso.
Popularizamos os computadores, globalizamos o mundo, caímos na rede e agora nos vemos frente a frente com os aspectos nocivos da internet.
Ah! Mas nós seres humanos somos criativos! E já temos a solução para este desafio: buraco negro.
Como assim?
Simples assim: “black hole resorts”- refúgios buracos negros.
Sim, hotéis instalados no alto de montanhas ou em vilas exóticas com total ausência de internet. Até as paredes serão impenetráveis ao acesso sem fio.
Que máximo!
  • A senhora que uma reserva num hotel 5 estrelas?
  • Não, não. Categoria buraco negro, por favor.
Será frequente ouvirmos:
  • Aonde vocês passarão a lua de mel?
  • Na Itália, num resort buraco negro.
É, para lua de mel, combina.
Já vejo aí uma nova oportunidade de negócios.
Olarias com a produção de tijolos buraco negro e arquitetos ilustrando as revistas de decoração na sessão “O quarto do meu filho é um refúgio buraco negro”.
E já que usei tantas generalizações, fica aqui um pedido pessoal: se você for se hospedar num refúgio buraco negro, me manda um e-mail antes de viajar para eu enviar meu endereço e assim você me envia um cartão postal contando sua experiência no tal refúgio na vila exótica, quem sabe eu me anime.
O que? Não sabe o que é um cartão postal?
Falamos disso num próximo post!
Beijos

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Casquinha de amendoim

imagem google


Há dias em que as coisas aparentemente simples de serem resolvidas, tornam-se tarefas das mais complexas, quando, por exemplo, você sai de casa bastante animado e acaba filosofando: “não devia ter saído de casa hoje”.
Aconteceu comigo na semana passada.
Tudo seria simples e rápido porque o que precisava ser feito estava pago e reservado, era somente retirar.
Animada, saí com destino à capital – ônibus + metrô. É fato que não contava com a chuva, mas não deixaria que um dia nublado e chuvoso influenciasse meu estado de espírito.
Organizei uma listinha de acordo com o trajeto e estava tudo caminhando bem.
Na metade da lista, entro na livraria na qual já havia encomendado e pago os livros escolares anteriormente, e já havia retirado a maioria, ficando pendente apenas dois itens.
Uma hora e quarenta minutos foi o tempo que eu utilizei lá dentro, entre localizar o pedido, ligar para o funcionário que me atendeu e justamente naquele dia estava de folga, informarem que o livro estava esgotado, porém estava pago e havia complicações no sistema para a devolução do dinheiro...
E meu sistema nervoso começou levemente a se alterar, o que foi contornado com técnicas de auto-sugestão, porém com o sistema digestório não houve técnica que dese jeito na fome.
Saí de lá insatisfeita, deparei-me com uma multidão dentro de qualquer lugar que vendesse comida que resolvi comprar de um vendedor ambulante um pacotinho com amendoins de casquinhas vermelhas lustrosas, daqueles que se vê o cristalzinho de sal reluzindo.
Andando, segurando o guarda-chuva e comendo.
No meio do caminho guardei o pacotinho e segui até uma outra livraria aonde o livro estava reservado e eu recebera um e-mail informando da chegada do pedido.
O setor de reservas é sempre vazio. Naquele dia havia uma considerável fila. Tudo bem. Aquele era o penúltimo item da listinha.
Na minha frente havia um senhor de sobretudo. E seu atendimento foi sobremaneira demorado.
Primeiro falou o número do cpf e quando o funcionário voltou dizendo não ter encontrado o item, ele disse que estava perdendo momentos preciosos do seu trabalho, que trabalhava no São Paulo Fashion Week.
Imediatamente fiquei fascinada. Aquele senhor de sobretudo era uma figura importante da semana de moda.
Eu estava diante de uma celebridade, quero dizer, estava logo atrás.
Fiquei com um misto de nervosismo e empolgação, que peguei o pacotinho de amendoim e comecei a comê-lo sem tirar os olhos do tal homem que àquela altura já havia mandado chamar um superior, um chefe, um gerente, sei lá.
E prosseguia em seu discurso indignado que ele recebera um e-mail informando da chegada de seu pedido. Disse que gastou dinheiro com táxi e que bem poderia ir à Nova Iorque comprar o tal livro ( que era importado e bem caro).
Neste momento eu fiquei hipnotizada. Eu estava próxima a alguém que pode ir a New York só para pegar um livro.
Mastiguei o último amendoim, quando localizaram o livro noutra loja, no setor de artes.
Alguns minutos e chega uma funcionária ofegando porque deve ter corrido bastante e a chefe/gerente/ superior se desmancha em desculpas e solta em voz calma e clara.
Este livro será uma doação da loja para o senhor por todo este constrangimento”.
Embasbacada. Essa era a palavra para me descrever naquele momento.
Eu estava diante de um acontecimento.
Um homem de sobretudo e um livro doado... Eu estava aturdida.
Ele virou-se e disse que iria para o café. Ela respondeu que não se preocupasse com mais nada. Faria a nota de doação e o encontraria.
Minha vez de ser atendida.
Entrego meu documento porque agora que a lucidez voltou, lembrei-me que comi todo o pacotinho de amendoim e meus dentes poderiam estar impregnados daquelas casquinhas vermelhas. Era melhor nem abrir a boca, pensei. Pego o livro e vou embora.
A demora sinalizava que alguma coisa não ia bem. Eu começa a ficar preocupada com as casquinhas de amendoim grudadas nos meus dentes.
E depois de muita demora o funcionário me diz – seu livro não se encontra aqui, a reserva está na loja da Pompeia.
Um flash de segundo foi suficiente para eu me ver falando como o homem de sobretudo:
Eu sou muito ocupada, tive que deixar meus filhos com a vizinha, ainda nem coloquei o feijão de molho, gastei dinheiro com ônibus + metrô e bem poderia pegar um avião e ir até a cidade natal do livro, mas nesse momento lembrei do preço do cafezinho que o marido me contou que vendem no avião e lembrei também que podia haver uma casquinha de amendoim no meu dente. Achei melhor ficar de boca fechada e esquecer que eu também poderia sair de lá com um livro doado após falar também que eu recebi um e-mail de confirmação.
Sem mover os lábios, fui embora. Dei por encerrada a listinha.
Quando cheguei em casa e vi...

Foi realmente um milagre. Ainda bem que eu não abri a boca, porque o e-mail deles estava correto indicando que eu retirasse na loja da Pompeia. Eu estava na loja errada. Sobretudo passaria a maior vergonha.
Fiquei tão atucanada, que escovei os dentes e fui dormir.