domingo, 28 de fevereiro de 2016

Chá de coar


Veio apressada a Zefinha, enxugando as mãos no avental quando a segunda rodada de palmas soava lá do portão.
Exclamou um nossa, levando as mãos ao rosto e apertou ainda mais os passos.
Abraçaram-se, apertaram as mãos. Pediu um minuto para dar a volta e abrir a porta da sala.
Enquanto fazia a meia lua pelo quintal, já punha-se a encontrar solução para o embaraço: primos de segundo grau vindos de longe a fazer-lhe visita no final do mês. Despensa vazia, pagamento só no dia 10 e de certo, ficariam para um café. Não havia pó o suficiente para cinco pessoas.
Já destrancando a porta, a dificuldade da situação foi se dissipando. Alegrou-se em rever os parentes, perguntar pela saúde da caçula que os fazia viajar tão distante e que o doutor já se mostrava animado e espaçara a próxima para dali a um ano.
Depois vieram as perguntas sobre o tio, a comadre, a seca, as chuvas e quando olhou de soslaio para a cômoda, o despertador anunciava hora do café. Na falta deste, hora de chá.
Levou a leiteira com água a ferver enquanto estendia a toalha e acomodava as visitas ao redor da mesa.
Coou o chá, serviu com pedaço de bolo de fubá feito na véspera. Tudo acomodado com mais conversa e sorrisos.
Assustaram-se com a hora, que pareceu voar. Levantaram-se apressados.
No portão, abraços, aperto de mão.
Se Deus quiser dali a um ano se veriam novamente.
Zefinha prometeu que da próxima vez teria café.
"Mas a gente espera o ano inteiro Zefinha, só para tomar o seu chá. Eita que chá como o teu ninguém faz. Deve é de ter algum segredo. A gente volta. Cê fica com Deus viu."
Colocou novamente o avental e foi arrumar a louça da cozinha. Estava feliz: nem perceberam o aperto da falta de café. Gostaram mesmo foi do seu chá!

Inspirei-me a escrever este pequeno conto depois que precisei fazer uma pesquisa na internet sobre chá e me surpreendi com o tanto de belas imagens de chás em saquinhos. Em sua maioria marcas importadas em canecas decoradas. Dei-me conta que muita gente, talvez os mais jovens nem saibam da existência do chá "de coar". O chá mate que hoje gourmetizou e foi parar em latinhas, garrafinhas, e caixinhas bonitinhas.
E então eu senti uma vontade danada do chá coado que tantas vezes me aqueceu, alimentou, emoldurou uma boa prosa. E fui comprar.
Difícil encontrar... Só fui achar num mercadinho pequeno, ali meio escondido, até com um pouco de poeira na caixa.
E o que se dirá sobre os chás feitos de um punhado de folhas colhidas ali no fundo do quintal?
Quase peça de museu.
Assim também me lembro de Rubem Alves falando sobre uma mulher que daria um ano de sua vida para Deus para que Ele, em troca lhe desse uma das noites de sua vida a beber do chá que a mãe fazia.
Se quiser ouvir essa história, ela está aqui.
Você tem alguma história com chá? Gosta de que tipo?
Beijo!

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

No meu dicionário


Qualidade da foto de uns setenta anos atrás. Relevem.
Eu mesma no retrato. Sorrindo para disfarçar o desconforto do peso da mala.
Sem rodinhas, sem alças. De mão mesmo.
Não acredita que estava pesada?
Pois bem, ali dentro eu carregava todas as palavras do mundo. Do meu mundo, do meu idioma. Todas devidamente registradas no pequeno, porém grosso dicionário escolar.
Durava por vários anos. Era bem cuidado: havia um canto especial para ele dentro da mala.
Acontecia de repentinamente uma professora solicitar um outro dicionário pois para ela, aquele já não era tão bom, havia um mais atualizado. Até podíamos utilizar o antigo, mas no geral ele era substituído.
Eu realmente acreditava que todas as palavras estavam ali. Tentei até imitar uma colega de sala muito inteligente que lia dicionário. Apenas tentei e não avancei nem até a metade do "a".
Em algum momento do primário alguém descobriu que havia lá um palavrão.
Claro que fui procurar. Em casa, escondida, cheia de culpa, achei o sinômino de duas letras para ânus. Foi um horror.
Outro horror foi logo no início do ginásio um professor severo nos revelar que a língua era viva e que dicionários nasciam de tempos em tempos. O que significava que uns outros tantos ficavam obsoletos.
Que decepção. Achava que fossem irretocáveis.
E fui ao longo dos anos me habituando com uma ou outra palavra que merecia entrar numa edição revisada.
Muitas me causavam estranheza, repúdio, mas segui carregando dicionários malas a dentro.
Agora, já me acostumei com a língua viva. No final do ano, por exemplo, sei que uma palavra será eleita para adentrar no conceituado dicionário Oxford.
"Selfie" já ganhou seu lugar.
Emoji foi a eleita do ano que passou. Aliás nem foi a palavra, mas sim aquela carinha de chorando de alegria.
E assim seguem nossos dicionários, ora reformas ortográficas, ora novas palavras.
Acabei de me lembrar que a tal busca pelo sinômino de ânus com duas letras caiu no ouvido de algum padre em absoluto segredo de confissão. Lembro-me de ele ter me dito para nunca mais ficar procurando essas palavras pecaminosas.
E realmente eu nem procuro mais.
Nem preciso mais procurar. Elas me chegam assim, do nada.
E nem me causam mais espanto, nem me levam mais para o confessionário.
Quer um exemplo?
Você é foda, hein?!
Sim, isso mesmo que você leu: você é foda.
Agora, se você está achando que eu te xinguei ou estou a usar um termo chulo, meu amigo me desculpe dizer, mas, você está mais ultrapassado que essa foto aí acima.

"Para essa geração, foda é adjetivo e não palavrão"
Pitty Leone

Sacou? Você é foda é o maior dos elogios que uma pessoa pode receber.
Dizer que você é o máximo é pouco perante a grandiosidade desse imenso, agora, adjetivo.



segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

A velocidade da vida

Já tem um tempo que, conversando com uma amiga, decidimos em comum acordo parar com "ah, estou sem tempo, ah não tenho tempo para nada". Reclamar da falta de tempo virou uma mania, um vício que não vai modificar o andar dos ponteiros ou qualquer medidor de tempo digital.
É dentro de nós que precisamos apaziguar o fluir do tempo. 
Fato que nos dias atuais o aumento das tarefas, trânsito, tudo isso demanda sim tempo e ele pode ficar apertado para determinadas coisas. Mas há que se respirar profundamente para cessar essa correria toda!
Nessa semana que passou, chegou-me em momentos diferentes, três "coisas" que falavam do mesmo assunto: a vida apressada.
Um artigo, um programa de tv e depois uma mensagem extraída do facebook que me foi envidada por e-mail.
Compartilho então duas dessas mídias.
O programa de tv tem trinta minutos.
E o texto, não é meu. A fonte é o facebook/Ensinamentos do Pai.

A VIDA FAST

Atualmente tudo virou fast, queremos cada vez mais velocidade em tudo, não temos tempo para mais nada, e quanto mais veloz, melhor. Não importa a idade, desde criança pequena, com seus joguinhos, à pessoas de idade. Tudo parece que se globalizou com o FAST.
Essa correria e rapidez da vida moderna está fazendo nos afastar do vivenciar, do aprender esperar e do comportamento.
As coisas lentas têm seus ensinamentos, seus aprendizados. Vivemos em um dia todas as sensações: amamos, odiamos, confiamos, traímos, e todo resto. Tudo isso acontecendo numa velocidade alucinante. Estamos precisando aprender algumas coisas que fazem a vida valer a pena de ser vivida. Não temos mais conversas, músicas, precisamos baixar com rapidez, frases curtas, caretas para expressar o que desejamos ou sentimos.
As pessoas estão esquecendo que a rapidez de tudo está matando dentro de nós valores essenciais para nossa praticidade de vida, do comer ao se relacionar, tudo ganhou uma velocidade enorme. Se nosso pedido demora um pouco, perdemos nossa paciência e nosso apetite. Se o que compramos demora para chegar, perdemos nosso interesse. Se nossas mensagens demoram a ser visualizadas ou respondidas, pronto, já estamos uma revolução e soltando o verbo. Onde fica a calma, a paciência, o respeito, a privacidade, o tempo para conversar e principalmente o tempo para refletir?
A velocidade da vida moderna não está ensinando a pessoa a usufruir do tempo, pois quando o temos não sabemos o que fazer com ele.
Reavalie sua maneira de viver, verifique se essa velocidade em tudo está sendo saudável. Se antes de darmos o 1˚beijo, não seria melhor termos uma boa conversa; se antes da 1ª transa, termos um pouco de tempo para sentirmos com quem estamos deitando, e antes de sairmos esbravejando com pessoas lentas, se não seria melhor aprendermos com elas a ter paciência, a esperar a conversar.
As pessoas modernas continuam velhas no seu interior, a velocidade só vai ser benéfica se soubermos conservar nossos valores de afeto para com os outros, porque enquanto buscamos velocidade em tudo, estamos a passo de tartaruga em construir relações e a passos de formiga em cultivar o afeto e o carinho.
A qualidade de vida está em termos afeto e carinho em tudo o que fazemos. E isso leva tempo para se fazer.
Ctba, 26/01/2016
Fonte: Facebook / Ensinamentos do Pai

Programa JC Debate


E você, está em harmonia com o tempo?! Conta aí!