sábado, 30 de dezembro de 2023

Obrigada pela companhia!

 


Fiquei olhando demoradamente para meu próprio blog; olhei exatamente para o arquivo e seus números.
Meu olhar encontrou não apenas a retrospectiva de um ano. Aliás, 2023 foi realmente um ano em que vi meu blog reviver. Encontrei e reencontrei tantas pessoas por aqui!

Talvez por um fio meu blog deixou de existir - foi apenas uma postagem no ano de 2021. Acho que não havia forças em mim, as palavras silenciaram. Com esforço e timidamente retornaram, ainda que em que pequeníssima quantidade, em 2022. E agora, neste ano que vai nos deixando, posso dizer que me encheu de alegria ver 79 postagens.

Muito mais do que números, manter, cuidar, zelar por um blog significa que vocês, blogueiros, leitores e amigos, nutrem essa força encantadora e misteriosa da arte de blogar.

Não são os números. E claro, eu gostaria sim de no próximo ano escrever 365 posts, ou ainda 400. Duas postagens no mesmo dia, eu já fiz isso e sei que há dias muito inspiradores! Mas esse estar nos blogs não precisa de pressa, de velocidade aumentada, muito menos de números elevados.

Espero apenas poder estar, com mais presença, dedicação e inspiração.

Obrigada a todos vocês que fazem parte dessa arte tão bonita que é blogar.
Que tenhamos boas palavras para partilhar em 2024!
É uma alegria seguir com vocês!

segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

A alegria, eu e o Sr. Franklin

 Despertei na manhã do sábado, 16/12/2023 tomada por duas agradáveis sensações: o dia das celebrações formais - colação de grau e baile de formatura de meu filho havia chegado, e junto a isso, ou talvez mesmo, primeiro que tudo isso, havia em meu coração a lembrança do Sr. Franklin.


Mudei de cidade para que meu filho pudesse estudar e realizar seu sonho de estudar no Instituto Tecnológico da Aeronáutica, o ITA.


Sr. Franklin foi um dos primeiros moradores com quem comecei a interagir. Conversa de elevador: “ah, o cachorrinho vai passear assim tão cedo? O tempo quente, a frente fria chegando”. 


Como meu cachorrinho não era nada educado para as suas “necessidades” , era bem cedo que eu o levava para a rua e assim muitas vezes, um aceno, um sorriso, a gentileza de segurar o elevador para mim.


Em algum momento em nossas conversas, descobrimos que meu filho e o filho dele estudavam para realizar o mesmo sonho em comum!

Em algum momento também eu soube pela sua esposa que ele transportava consigo duas dores para as quais as palavras não dão conta. Seu Franklin havia perdido dois filhos de seu primeiro casamento. Dois filhos já adultos, num intervalo relativamente curto um do outro. Todas as manhãs que eu o via, ele estava indo para a missa. Diariamente, cotidianamente, silenciosamente. A primeira missa da manhã.


Então chegou um dezembro, dessa vez era uma sexta-feira e quando nos encontramos eu, o cachorro e o Sr. Franklin, ele me disse “é hoje né que vai sair o resultado do vestibular para os meninos, vamos torcer.”


Um pouco antes das oito e meia da manhã, meu filho atendia uma ligação e do outro lado da linha informavam que ele havia passado no vestibular.


À tarde daquele dia também festivo, estávamos eu, marido e o cachorro numa praça quando veio se aproximando o Sr. Franklin. Ele havia ido até a praça próxima do condomínio onde morávamos para nos parabenizar.


Abraçou meu marido, sorriu, disse-nos que seu filho não havia conseguido, mas ele estava muito feliz por nosso filho.


Aquele gesto do Sr. Franklin, aquela alegria pelo nosso filho…


Esse ano eu soube que o Sr. Franklin havia falecido. Nós já havíamos mudado de cidade, então não foi possível abraçá-lo quando ele recebeu a notícia de que seu filho havia passado no vestibular tão sonhado!


Há algum tempo eu me deparei com o conceito do não-saber. E tenho exercitado esse lugar, essa experiência do não-saber.


Eu não sei o porquê de ter acordado no dia dos eventos festivos da formatura com o coração preenchido pela lembrança do Sr. Franklin.


Permiti o não-saber. Não era preciso encontrar respostas. Era tudo simples e pacífico.


Seguimos para a colação de grau e eu dediquei toda aquela alegria e energia ao Sr. Franklin. Eu me alegrei pelo meu filho, eu me alegrei pelos outros 104 companheiros de turma.


Em breve será a vez do  filho do Sr. Franklin estar envolto nas festividades da sua formatura. Tenho certeza que o sentimento de alegria e resiliência que o Sr. Franklin emanava de alguma forma se fará presente na formatura de seu filho.


 O Sr. Franklin me mostrou que há espaço para a alegria e tristeza coexistirem. Há beleza mesmo quando há dores.


E como eu aprendi tanto sobre alegria com o Sr. Franklin, vou partilhar aqui os nossos momentos alegres deste dia!







Teve show da 
Esquadrilha da Fumaça!





Esse é o vídeo com a cerimônia inteira.
Corram até o minuto 39:40
A galera gritando "Todd" o apelido do Bernardo!

E depois, ao final,
2:18:00 começa a fala do reitor
parabenizando o Bernardo, o mais jovem
engenheiro formado pelo ITA!

















quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Curas e blogs

 Hoje pela manhã eu ouvia um podcast e, a certa altura da conversa, a moça disse que num momento de muita dor emocional, alguém lhe sugeriu que criasse um blog e passasse a colocar ali sua dor espalhada em palavras, para que não se perdesse os tantos caderninhos, papeizinhos onde ela fazia as anotações pois já tinha o hábito da escrita.

Assim fez a tal moça no intuito de organizar suas coisas, sua dor. Só que, os comentários e leitores começaram a chegar. De início ela se assustou um pouco, se incomodou outro tanto. Afinal era a dor dela e naquele momento, além de não entender o que exatamente era um blog, achou estranho outros acessarem suas fragilidades.

Os comentários porém eram tão afetuosos, ela começou a receber tanto amor de pessoas desconhecidas, de outros países, o que a fez entender sobre a profundidade e o manancial de ternura que pode ser um blog.

Isso me fez refletir sobre muitos blogs, que hoje são pessoas amigas, que surgiram pela dor. Dor que trouxe o processo de escrita, as trocas com leitores, a possibilidade de receber afeto que chega em forma de um comentário e a cura, a transformação de emoções difíceis.

Os outros tantos blogs que tiveram nascimentos por outros motivos, em algum momento no atravessar do tempo, pode ter sentido vontade de expor alguma dor. Se não temos a cura completa, de alguma forma abrir-se para os outros, expor nossas fragilidades, pode mesmo nos ajudar.

O velho clichê " a vida não é feita só de alegrias"... tão verdadeiro, por vezes assustador, pode encontrar na escrita essa possibilidade de ser suavizado e até mesmo curado.

Quero finalizar com uma frase colhida num livro e flores colhidas num pequeno bosque com as quais presenteio a Chica pelo seu aniversário ( desculpe-me o atraso ) para festejar sua vida tão preciosa entre nós aqui dos blogs e toda sua família e amigos! Felicidades Chica!


"[...] Experimentou a compaixão em diferentes cores, culturas, religiões e profissões, e o que surpreendeu Harry foi que cada pessoa compassiva falava a mesma linguagem do amor".



Parabéns Chica!


terça-feira, 21 de novembro de 2023

O menino formou!

A fotografia nos chegou hoje pela manhã. Nosso filho concluiu a graduação universitária. Nosso menino formou!

 


Bernardo assinando seu diploma de Engenharia Aeronáutica


Muitos amigos aqui conheceram o Bernardo ainda pequeno. O garotinho que adorava os trilhos e trens!



A vida o levou a trilhar não os trens mas sim os aviões!
E hoje temos o engenheiro aeronáutico.

Na semana passada ele apresentou seu trabalho final do curso e obteve a aprovação. Para comemorar, um pulo de roupa e tudo na piscina do alojamento onde mora!



Foi uma jornada, um caminho com seus percalços e suas alegrias.
Cinco anos de estudos, dois deles atravessados pela pandemia.

As celebrações oficiais, colação de grau e baile de formatura, serão realizados no mês de dezembro.

E para celebrar essa caminhada, o esforço, a dedicação, as travessuras, colocarei algumas fotos do Bernardo em momentos diversos:



Estudava muito é fato e a infância foi muito bem vivida!




Entre pessoas muito queridas: o mantenedor da escola onde estudou e sua esposa


Saindo de casa com 15 anos para morar sozinho
Teve choro, teve coração apertado




Cumpriu o serviço militar obrigatório


E após esses cinco anos, o momento é de comemorar!


Parabéns meu filho! Estamos sempre ao teu lado!
Te amamos 💙
















domingo, 19 de novembro de 2023

Banho de floresta

 Escrevo no final da tarde de um domingo. Não um domingo qualquer. Esse é o domingo após os dias e noites de calor mais intenso ( até agora ) que certamente foi sentido por uma boa parte do nosso país.

Uma chuva constante cai desde o início da tarde e as temperaturas agora estão amenas.

Faz algum tempo desde a minha última publicação. Eu estava imersa em uma leitura, queria finalizar o livro pois tenho vários que parecem estar encalhados, então realmente me dediquei. Cada espacinho de tempo livre eu usei para avançar as páginas e deu certo! Leitura concluída!

Por coincidência, ou sincronicidade, que é palavra mais bonita, havia um capítulo no livro que tratava do clima, do ambiente externo. O título: "Saia de casa ( e mexa o corpo ).

Fiz algumas anotações que achei interessante.

- Professor Trevor Harley é psicometeorologista.

Nunca tinha ouvido falar nessa especialidade que trabalha com a interseção de psicologia e clima.

Mas, pensando melhor agora enquanto escrevo, isso não chega a ser uma novidade. Nesses dias de temperaturas extremadas, a gente encontra alguém na rua, no elevador e vai papeando " nossa, que calorão hein? não dá ânimo para nada". É a nossa versão popular para a tal psicometeorologia!


Algumas descobertas dessa área de estudo:

A baixa no humor tem relação com a temperatura e o vento.

Em dias ensolarados somos mais simpáticos uns com os outros. Até as gorjetas são mais generosas em dias de sol.

No entanto não gostamos de calor nem do suor excessivos.


Em seguida a essas descobertas relacionadas com o clima e nosso humor, o assunto foi o banho de floresta.

Eu já tinha esbarrado de maneira muito superficial nesse "banho de floresta", mas agora compreendi um pouquinho melhor. O bom mesmo seria poder fazer um!

Shinrin-yoku é a palavra japonesa para definir esse conceito, essa prática que lá no Japão é levada muito a sério. 

Há uma teoria que diz que as árvores emitem substâncias chamadas fitoncidas que são semelhantes a óleos essenciais. Inaladas por nós, as fitoncidas despertam mudanças em nossos corpos. Observou-se redução da pressão arterial, redução do stress, aumento da imunidade e ainda nos torna mais resilientes. Viva as árvores, as áreas verdes, os bosques e florestas!

Na falta de uma floresta por perto para chamar de sua, o livro segue exaltando os benefícios ( que qualquer pessoa sabe, nem precisava de pesquisas! ) do mar.

Um psicólogo ambiental - e eu também não sabia que existia essa especialidade - nos diz que "muitos processos são exatamente iguais aos obtidos nas áreas verdes, com benefícios adicionais". Ele, o dr Mathew White refere-se ao mar.

Não é de hoje que reconhecemos a influência do mar quando precisamos nos recuperar ou recarregar as baterias. A simples visão da água exerce um efeito psicológico restaurador.

Eu, que não estou nem perto do mar e nem de uma floresta ou boa área verde ( estou sim numa selva de concreto ), tenho que me valer das escapadelas que damos vez por outra. Mar, fragmentos de mata atlântica, ou mesmo um lindo vaso de flores dentro de casa já ajuda!

Você sente os efeitos do clima no seu humor? Dorme melhor após uma caminhada a beira mar? Fiquei curiosa!

Deixo algumas fotografias do meu banho de floresta em terras cariocas e o desejo de um bom início de semana!


















sábado, 11 de novembro de 2023

Nós no Copacabana Palace!

 Vocês se lembram da nossa viagem ao Rio de Janeiro?

Tem mais causos daqueles dias ensolarados de outubro!

Pois bem, cada vez que marido sonhava em voz alta sobre passarmos uns dias na cidade maravilhosa, ele sonhava alto mesmo: " E se a gente ficasse no Copacabana Palace, de frente para o mar? "

Eu respondia com um apenas "ah sim" e lá ia ele pesquisar os preços.

- Não é possível... que será que tem nesse trem* para custar tão caro assim?

*marido é mineiro e fala bastante trem que significa muitas coisas, aliás só mineiro mesmo para entender desse trem.

Eu tentava consolar marido dizendo que o preço caro devia ser por conta da roupa de cama. "Devem ser tantos fios egípcios nos lençóis e fronhas que a gente não faz ideia".

- Não, não. Não justifica.

- A carta de travesseiros. 

- Tem isso é? Que trem é esse que nunca ouvi falar?

- Várias opções de travesseiros para você escolher. Alto, baixo, para quem dorme de lado, de costas, macio, anti-stress, por aí vai.

Nada do que eu imaginava e falava, aquietava a indignação do meu marido, então resolvi pesquisar na internet.

E vai daqui e dali, muitas páginas depois, cheguei a uma "influencer das viagens" que ficou hospedada lá e mostrava em fotos sua suíte, os detalhes, o glamour. Já quase para o final da postagem dela, estava algo que fez meus olhos brilharem. Dizia mais ou menos assim: " você sabia que mesmo não estando hospedado no Copacabana Palace, você pode tomar o café da manhã ao redor da piscina, tomar um capuccino à tarde ou mesmo comer uma pizza no restaurante do Copa?"

Eu ouvi pizza?!

Segui os links que ela disponibilizou; num outro dia esperei meu marido sair para trabalhar e telefonei para averiguar se era verdade mesmo todo aquele trem!

Era perfeito! Cabia no nosso orçamento, claro teríamos que ser cautelosos e foi assim que pisamos no Copacabana Palace!



Eu tinha ficado um pouco pensativa pois eu não tenho bolsa à altura de um Copacabana, essas bolsas que custam o valor de um carro. Resolvi o impasse: pedi para marido colocar meu documento no bolso da calça dele e segui feliz sem bolsa!


Ficamos à beira da piscina, tinha música boa e após nos acomodar, o garçom nos trouxe a carta de vinhos.
Passear os olhos por ali foi uma experiência incrível já que eu não entendo nada de vinhos e também não bebo, assim como marido.

-  Onze mil reais uma garrafa de vinho? Olha esse aqui então de trinta e dois mil - falávamos baixinho.

Uma água com gás foi nosso pedido.

Então veio o cardápio das comidas. Aí eu me desesperei. Cadê as pizzas?

Falei serena para o garçom -  a gente veio para provar a pizza de vocês!

Rapidamente ele nos trouxe outro cardápio e escolhemos nossa pizza.


Estava deliciosa! E queríamos fechar nosso jantar especial com sobremesa. Pedimos sorvete. Era tão caro que imaginamos algo de extraordinário tamanho. Tipo uma pirâmide de sorvete.

Primeiro chegaram as colheres de sobremesa.
Olhamos silenciosos e discretos, até que marido exclamou - mas tá parecendo a colher do papai!

Foi só risada! Para o padrão Copacabana e o preço daquele sorvete, a colher de sobremesa deixava a desejar.

Estavam gastas, mas tão gastas, tão surradas as coitadas ( que pena que eu me pus a rir e esqueci de fotografar! ) que o único jeito foi imaginar por quantas bocas famosas as colheres já passaram. Frank Sinatra? Pelé?

E então chegou nosso enoooorme sorvete.
Que decepção...


Marido tentou amenizar a situação -todo aquele preço por uma bolinha assim, meio derretida de sorvete? Ah mas deve ser um sabor assim indescritível.

Nada disso, sabor totalmente descritível: parecia sorvete ali da esquina, do mercado mesmo.

Conta paga, atendimento gentil, pizza maravilhosa, sorvete deplorável, música boa, mas eu queria um tantinho a mais. Perguntei ao garçom se era permitido subir ao terraço, ao que ele foi afirmativamente nos mostrando o caminho.

Estávamos sozinhos ali. Disse para marido sorrir e relaxar!




Foi muito divertido estar ali naquele mundo que não do qual não faço parte.

À medida que a noite avançava todo aquele espaço ficou lotado. Sotaques variados, vestimentas glamurosas , bebidas, comidas. Então me lembrei de algo que um amigo me disse certa vez.

"Quando você estiver num ambiente assim de muita riqueza material, deseje com força, com todo o seu coração que, aquelas pessoas ali tenham o coração tocado, amaciado, que elas façam grandes doações, criem projetos incríveis que torne a vida dos não favorecidos, melhor; que elas sejam generosas com seus funcionários e que elas descubram que no fundo, no fundo, aquela felicidade ali daquele lugar não é a real felicidade. Que elas nunca fechem os olhos para as desigualdades, e a gente segue fazendo o nosso possível, nossos pequenos e simples gestos".

Eu achei tão bonito, tão profundo isso que ele falou que foi inevitável não desejar que se torne realidade. 













terça-feira, 31 de outubro de 2023

Gestos simples

 " Servir os outros não tem de ser algo grandioso. Conceder um gesto caloroso a alguém que nós nem sequer conhecemos - digamos, no ônibus - pode fazer diferença tremenda para aquela pessoa. Pode trazê-la para fora de um lugar de profundo isolamento".

Elizabeth Mattis Namgyel



Ouvi a frase acima no último domingo, dentro de um grupo de estudos, e a pessoa que o conduzia, retomou a frase várias vezes e nos inspirou a refletir na nossa mania de grandeza, de querer fazer algo que impacte o mundo, ou mude a vida de milhares de pessoas, e assim nos perdemos de perceber, receber e oferecer gestos simples.

Sem que eu precisasse fazer qualquer esforço, emergiram da minha memória, com muita clareza, algumas histórias que eu presenciei assim "meio sem querer" e que exemplificam nitidamente esses pequenos gestos, esses gestos simples capazes de mudar uma vida, inteira, por momentos, e que passam despercebidos porque temos sede de coisas grandiosas.

Uma dessas histórias se deu assim: eu estava andando na Avenida Paulista, me lembro que era um dia de semana. Um homem que caminhava a minha frente, virou-se para o outro ao lado dele e falou - "eu tomei um banho ontem, tinha sabonete, tudo. Rapaz como um banho faz bem pra gente, dá um ânimo né pra seguir a vida".

Naquele momento em que ouvi essa conversa, eu pus reparo e vi que eram pessoas em situação de rua. Um banho tirou aquele homem de um lugar de profundo isolamento e talvez mesmo, um lugar de sofrimento. A água, o sabonete, o frescor no seu corpo devolveu-lhe esse sopro na alma, esse ânimo de viver...

No metrô aqui de São Paulo, mas acredito que em outras capitais também ( já vi a Pandora falando sobre ) o comércio dentro dos vagões, a tentativa de ganhar uns trocados das mais variadas e criativas formas, viraram rotina.

Eu estava em pé num vagão relativamente vazio. Não havia lugar para se sentar, mas não estávamos espremidos entre vários humanos!
Entrou um artista, um músico. Qual instrumento ele tocava, eu realmente não me lembro. A música sim, Asa Branca. E essa não me saiu da memória porque além do vagão inteiro cantar, a conversa que eu ouvi depois me causou espanto. Aquele espanto bom e feliz, sabe?!

O moço cantou e tocou, tirou os olhos de muita gente do celular, fez outro tanto de pessoas cantar e depois passou o seu chapéu e entre notas e moedas, desceu na estação que se aproximava.

Assim que saiu, a mulher que estava sentada, eu de pé ao lado dela, virou-se para a outra no mesmo banco e disse o que eu interpreto como um desabafo feliz!
" Olha, eu nem te conheço mas vou te contar uma coisa, como uma música assim faz bem pra gente! Teve um dia que eu tinha decidido que ia tirar a minha vida. Eu tava voltando do trabalho, não aguentava mais nada e só queria chegar em casa pra fazer a besteira. Sabe que entrou um moço assim e começou a cantar e aquilo era tão bonito e entrou em mim... moça, eu comecei a chorar e vi que não valia a pena acabar com a minha vida. Uma música me salvou!

Eu tinha achado tão bonito, foi tanto espanto na época em que ouvi aquilo de uma desconhecida dentro do metrô, mas depois que eu recordei isso com essa luz vinda da frase lá de cima, ficou ainda mais especial!

A outra e última história por hoje me envolve diretamente.

Meus filhos, Bernardo e Júlia, eram pequenos e eu estava com eles num parque, que na verdade era do tamanho de uma praça grande, e eu os levava lá para andarem de bicicleta. A Júlia com rodinhas, o Bernardo já sem.

Durante a semana era bem tranquilo e eu me posicionava num local que bastava girar um pouco o corpo e eu podia ver as crianças no ponto mais distante e logo retornando em suas bicicletinhas.

Num desses dias, uma mulher me parou.

"Oi! Você lembra de mim? - ela indagou sorridente e parecia esperar por uma resposta afirmativa.

Não fiz todos os esforços necessários para lembrar porque eu tinha que estar de olho nas crianças.
Mas, confesso que tentei e nada. Eu realmente não conhecia aquela mulher.

Ela insistia de forma delicada, ela fazia um esforço para que eu me lembrasse.

Então após aquele deserto, sua voz saiu gentil:

- Eu me lembro de você como se fosse hoje; aliás eu nunca vou me esquecer. Você foi tão doce comigo, o tempo todo segurava a minha mão, enxugava o suor do meu rosto e me ajudava a respirar. Você ficou o tempo todo comigo até que meu filho nascesse!

Ah, a maternidade! - eu exclamei mesmo sem me lembrar da mulher à minha frente. Já faz tempo que eu deixei de trabalhar e ainda brinquei com ela para tentar me redimir do fato de continuar a não lembrar. "nossa, mas eu sempre estava de touca e máscara e ainda assim você se lembra de mim?!

"Nunca vou esquecer seus olhos e como você foi importante naquele momento em que eu estava com tanto medo. Obrigada".

Acho que a conversa durou o tempo de uma volta com as bicicletas, quando as crianças retornaram eu já me despedi um tanto sem jeito pela falta da lembrança. Desejei felicidades a ela e a seu filhinho e nossos destinos seguiram seus rumos.

O gesto simples fora meu. Eu havia oferecido um olhar, uma mão, talvez algumas palavras. Era só o meu trabalho.
Em dias de mudança de lua, a cegonha sobrevoava aquela maternidade com voracidade! Vários partos acontecendo ao mesmo tempo. Seria mesmo difícil de me lembrar. Logo após o nascimento, a recém-mamãe já era levada para outra ala.

Um gesto simples, pequeno, marcou aquela pessoa e eu sequer saberia disso, que um olhar e uma mão segurando outra podem ser inesquecíveis!

Pediria para você voltar lá pra cima e ler novamente a frase e pensar nos gestos de simplicidade que você oferece ao mundo,  ou os que te ofertaram.
Vou fazer melhor e trazer a frase novamente aqui. Que ela te inspire!

 " Servir os outros não tem de ser algo grandioso. Conceder um gesto caloroso a alguém que nós nem sequer conhecemos - digamos, no ônibus - pode fazer diferença tremenda para aquela pessoa. Pode trazê-la para fora de um lugar de profundo isolamento".

Elizabeth Mattis Namgyel






domingo, 29 de outubro de 2023

Amor não tem lado

Não estava conseguindo escrever; queria, porém não encontrava cadência para dar às palavras.

Os desafios, as cirandas de brincadeiras das blogagens coletivas são excelentes maneiras de mantermos a escrita fluindo e me alegra imensamente que temos pessoas queridas que cultivam e estimulam as práticas coletivas e toda a interação que isso gera.

 Mesmo assim não consegui participar nem interagir. Confesso que toda essa bagunça de sentimentos que vieram à tona com a mais recente guerra e que vi exacerbada em muitos perfis que eu sigo "na rede de fotografias e vídeos" drenaram minha vontade de escrever.

Foi somente hoje, um domingo chuvoso aqui na região, que me deparei com uma fala tão oportuna, tão elevada que me deu vontade de registrá-la aqui.

Parece que estamos fazendo uma outra guerra com nossas narrativas, com nosso desejo de impor um lado em detrimento do outro.

As frases, os pensamentos que coloco a seguir são de Esther Perel do dia 11 de outubro de 2023. Selecionei algumas:

"Seja cuidadoso para não perder a sua humanidade.

Tenha o cuidado de separar as pessoas das ações dos terroristas que vivem entre elas.

Tenha o cuidado de reconhecer que a tristeza por pessoas em um lado não significa ódio pelas pessoas do outro lado.

Tenha o cuidado de entender que apoiar um lado não significa odiar o outro.

Tenha o cuidado de não adicionar ódio em cima de ódio. Todos nós estamos sendo esmagados debaixo de seu peso ( o peso do ódio).

Não perca o contato com as partes de você que o mundo mais precisa: sua compaixão, sua humanidade e seu cuidado"  Esther Perel


Nossos corações estão tão quebrantados, que estamos pedindo por paz, escrevendo sobre paz, cheios de armas e ódio.

Que a paz que todos desejamos, exaltamos, esteja verdadeiramente presente em nossos corações, em nosso interior.

Sejamos instrumentos da paz, como Francisco, o de Assis ensinou.



Ouvi as palavras da Esther Perel neste podcast aqui