sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Medo da morte

Tenho medo. Estou com medo. Medo da morte. Medo da morte morrer.
Você leu direito sim, não é nenhum trocadilho - tenho medo da morte morrer.

Eu estava no supermercado quinta-feira, dia primeiro de novembro, o dia de todos os santos que na minha infância, lá no colégio católico no qual eu estudava, não havia aula, em respeito.
Lá no supermercado, estava uma moça bem jovem que falava ao celular, chamou-me atenção primeiro, a sua voz, a tonalidade daquela voz - mezzo soprano. Um tom grave, imponente e adocicado.
Ergui os olhos dos limões para olhar em direção à moça e pude ouvir a sequencia de sua conversa: 
"Amanhã eu farei uma feijoada lá em casa... sim. sim, só falta pegar limão pra caipirinha. Tá, te espero. Beijo."

Dos limões para a moça, meus olhos pousaram depois em seu cestinho de compras. Dois pacotes de feijão preto, carnes, couve.

Pensei comigo que aquela moça tão jovem sabe fazer feijoada e eu, com mais que o dobro da idade dela, não sei.

Amanhã ( que no caso é hoje, dia dois de novembro, feriado de finados ) vai ter feijoada na casa dela. Será que é para homenagear algum finado ancestral apreciador de feijoada com caipirinha?
...
Diário de hoje, dia dois de novembro, feriado de finados.

Saio cedo com o cachorro. As ruas estão vazias e silenciosas, numa combinação dos que foram viajar com os que estão dormindo um pouco mais por conta do feriado.

Há uma escola aberta, afinal o Enem bate às portas. Um estudante entra.

Sigo para uma praça. Quatro outros estudantes da mesma escola, escolheram ficar debaixo de uma árvore jogando cartas.
Esses não pensam no Enem nem na morte.

Mais à frente uma mesa dobrável acomoda vários itens de café da manhã. Um homem com um apito na boca e gestos firmes comanda ladeira acima um grupo de corredores.
"Falta mais três chegadas, pensem no café especial depois!"
Esses correm da morte.

A morte segue evoluindo em seus rituais.
Já achei engraçado as carpideiras. Já me emocionei ao ver pela tv a cobertura dos túmulos mais visitados nos cemitérios de São Paulo. O dia de finados era um dia triste, cabisbaixo. A cobertura da tv agora mostra o movimento nas praias.

Antes tinha só o cemitério, várias são as opções mais modernas - cinzas acomodadas em um bonito e sustentável recipiente que plantado se transforma em árvore, ou ainda a opção de encaminhar as cinzas do ente querido para seres transformadas em fogos de artifício.

Tem também a celebração mexicana que é mais colorida e cheia de vida.

Tem as novidades tecnológicas aliadas com a biologia, medicina que prometem o fim da morte, título de um livro - A morte da morte.

Tem o aceno de viver trezentos anos.

300 anos recebendo WhatsApp de brigas relacionados à políticos? 

Acho que prefiro uma boa morte!

Viver bem é imprescindível para um bom morrer.

Fiz preces, agradecimentos e agora inicio uma nova leitura.

Bom feriado para vocês!



"No início, você deveria ser perseguido pelo medo do nascimento e da morte, como um veado escapando de uma armadilha. No meio, você não deveria ter nada a se arrepender, mesmo que você morra neste momento, como um camponês que tenha trabalhado a sua terra com cuidado. No final, você deveria ser feliz, como alguém que completou uma tarefa imensa"
Matthieu Ricard

6 comentários:

  1. Gostei de te ler... Realmente tudo está tão mudado... Lembro do dia de finados no meu tempo, era completamente silencioso,parecido com a sexta-feira santa!Hoje tão diferente. Vemos de tudo e passou a ser lembrado como dia de feriadão a aproveitar!

    Até eu não fui no cemitério...Mas não mais frequento por lá! Não mis sinto vontade. Falo com meus mortos, sem ir lá!

    Assim, as coisas vão se perdendo...


    Esse livro deve ser bem legal! beijos, tudo de bom,chica

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  2. Boa noite, querida amiga Ana Paula!
    Fui ao cemitério pela manhã, mas só vi a chorar além de mim, uma senhora com a neta. Apenas mais uma a rezar à beira da catatumba...
    Havia muitos vendedores de flores ornamentais ....túmulos que pareciam floriculturas e barracas na rua com água, refrigerante e outros ... uma alegre fesra.
    Por outro lado, os sinos da Matriz nós chamavam à missa...
    Caminhei e colhi muitas flores naturais em forma de fotografia...
    Meditei... refleti e vou adiante... sem medo.
    Deus a abençoe muito!
    Tenha dias felizes!
    Bjm fraterno e carinhoso de paz e bem

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  3. Também fui ao cemitério falar com a minha mãe.
    A morte não morre. Só nas histórias… Porque a morte faz parte da vida. Andamos com ela cravada no peito…
    Uma boa semana, Ana Paula.
    Um beijo.

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  4. Oi Ana Paula,
    não vou a cemitérios... não fui ao velório nem ao enterro de minha avó que
    faleceu a pouco. Fui ao enterro do meu pai, que já faz vinte anos que ele se foi, e o
    último enterro que fui, foi da filha de uma amiga, há cinco anos.
    Tenho verdadeiro horror da morte e de tudo que diz respeito a ela.
    Não foi sempre assim. De cinco anos para cá, com a chegada da depressão e a síndrome do pânico
    em grau elevadíssimo, sinto mal só de imaginar a morte.
    Desenvolvi Tanatofobia(medo sem limites da morte).
    Não tem sido fácil para mim...
    Sei que todos vão morrer, mas foge ao meu controle a dor que sinto.
    Mas um dia irá passar.

    Beijos, Deus esteja com você.

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  5. Ai Ana tudo bem!
    Na infância fui Católica, e depois de adulta sigo a Bíblia através do Evangelho.
    Nessa caminhada tenho aprendido a valorizar a vida enquanto vivos, através de apreciação da vida, oração, conversas.
    A morte faz parte e deixa muita saudades, mas creio que a morte é vida, porque um dia Jesus vem buscar todos nós para a eternidade.
    Deus abençoe a família.
    Beijos
    Ju

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  6. Ana, também prefiro uma boa morte...rs
    Estamos perdendo um pouco as essências, dando espaço para muitas loucuras e coisas nem sempre tão necessária assim..
    Gostei da dica de leitura...
    Beijos
    Ju

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