O segundo livro que li nesse 2023, foi Inventário do Azul de João Anzanello Carrascoza, editora Alfaguara.
Antes, porém, de falar do livro, da leitura, quero contar como eu “conheci" o escritor.
Bem, há uma dezena de anos, mais ou menos, nessa mesma época, o mês de fevereiro, em alguma manhã, antes que o sol do verão se tornasse escaldante, eu estava com o umbigo encostado em um balcão de papelaria para comprar a interminável lista de material escolar dos filhos, incluindo os livros didáticos.
Afora o dispêndio, era muito gostoso chegar em casa com todo aquele material e começar a encapar livros e cadernos e etiquetar tudo, tudinho, dos lápis aos livros.
Mas, havia uma coisa em especial que eu gostava muito: folhear o livro de Língua Portuguesa para ir encontrando os textos que eles estudariam. Geralmente eram recortes de uma texto bem maior. Sempre ao final, o nome do autor e o livro do qual fora extraído aquele trecho. Eu ia passando os olhos e me detinha em um e outro.
E foi num desses folhear que eu encontrei João Anzanello Carrascoza. Gostei tanto do pequeno trecho que estava ali no livro das crianças que anotei o nome do autor e a obra citada e algum tempo depois tínhamos o primeiro livro do Carrascoza.
O livro já voou da nossa estante para as mãos de uma querida amiga de blog, faz algum tempo; guardo com imenso carinho o título e a história. Era um livro infanto-juvenil - O Homem que Lia as Pessoas.
Foi o primeiro de vários outros do autor. Aliás, Carrascoza já apareceu aqui no meu livro duplicado! A história dos dois livros iguais - Caderno de um Ausente - está aqui!
Para esses autores que se aninham em nossos corações, nem precisamos saber do que se trata um novo livro! Não paira qualquer dúvida: tem lançamento e a gente já quer!
Mas com o Inventário do Azul foi diferente. Demorei para estar com o livro nas mãos. Tinha outros para ler e vinha aquela culpa literária - comprar mais um livro com essa pilha para ler?
Depois era a grana que não sobrava.
E aconteceu algo bem interessante nesse tempo relativamente longo, entre o lançamento e minha aquisição. O autor passeou por vários programas de entrevista, podcasts, lives no Instagram.
Então esse foi, posso assim dizer, o primeiro livro em que eu sabia muito a respeito sem ter lido a história!
Ouvi Carrascoza discorrer sobre como nasceu o livro ( época da pandemia ), a influência de sua viagem para a Índia, enfim foi uma delícia ouví-lo em vários programas diferentes e assim, a experiência da leitura, que já seria uma delícia, foi ainda mais!
Quero deixar um capítulo do livro Inventário do Azul. Todo o livro tem capítulos curtos.
É uma escrita de tamanha beleza que vem me encantando desde os tempos dos livros e cadernos encapados e etiquetados, que já ficaram no passado. Tem criança minha no último ano de faculdade e outra, quem sabe, adentrando a universidade!
Um pouquinho de João Anzanello Carrascoza para vocês se encantarem e lerem depois todo o inventário dele!
Legado
Pelos casamentos rompidos, legou aos filhos a família partida, o vazio insolúvel.
Legou aos filhos essa existência duplicada, as fatias de tempo entre a mãe ( os dias da semana ) e ele ( os sábados e os domingos ), o Natal numa casa, o Ano-Novo em outra, as duas sandálias havaianas, as duas escovas de dente, os dois blocos de ausências, o tijolo duplo do silêncio, e, inescapavelmente, às vezes, a dupla tristeza ( embora haja também a chance do duplo contentamento).
Entristece-o que sejam filhos dos desencontros humanos, dos abismos cavados a quatro mãos pelos casais, dos atos equivocados de suas mulheres, dos erros recorrentes dele próprio. Entristece-o que sejam filhos do amor ( e, em seguida, do desamor ), das vias já inacessíveis ao perdão, do cotidiano enganoso dos relacionamentos conjugais. Entristece-o legar ao rapaz e à menina um morro onde a ausência atingiu o cume. Entristece-o legar aos filhos duas dores crônicas sem que, como compensação, possa lhes oferecer o remédio de efeito dobrado, capaz de cicatrizar a história ferida deles e regularizar a arritmia do seu próprio coração.
Inventário do Azul página 296
Que lindo, Ana Paula! Adoro essa fase do cheirinho do novo material, livros, lápis, etiquetar...Tudo passa!
ResponderExcluirE nós ficamos com as saudades.
Aqui ainda compro, o material da Marina e entrego tudo pronto.
Que bom teu interesse e depois o livro,(até duplo) ter te encantado!
Gostei do capítulo e as palavras mostram situações infelizmente vividas por tantas crianças nascidas do amor e convivendo com a alternância de casas, amor e desamor...
Gostei muito! beijos,tudo de bom chica
Olá, Ana.
ResponderExcluirDepois de me emocionar lá no meu blog com o comentário sobre sua filha, agora você me apresenta um texto sobre o Carrascoza, autor que me acompanhou em alguns momentos de minha vida, e de quem aprecio muito. Não é uma leitura fácil para crianças que estão desenvolvendo o hábito pela literatura, mas ele é conciso, direto e sabe enlaçar o leitor de um jeito que não há como se livrar. Se deixar, você consome a obra em um único rompante. Muito bom.
E um livro, seja novo ou já antigo, sempre exerce um fascínio. Linda crônica.
Grande abraço e um ótimo fim de semana a ti e família.
Marcio
Olá, Ana Paula.
ResponderExcluirVi o seu comentário no Ciranda de Frases, obrigada querida.
Também gosto muitíssimo de ler e que bom que encontrou um autor que muito gostou, também fico maravilhada com esses encontros. O livro parece ótimo pelo que falou e pelo texto que compartilhou.
O meu abraço...
Boa tarde, Paula
ResponderExcluirJá encapei muiiitos livros e cadernos dos meus filhos. Como me lembro desta época...
O livro parece excelente.
Te desejo um abençoado fim de semana e boas leitura.
Muitos beijinhos
Verena.
Olá querida
ResponderExcluirComo eu amava mexer com materiais de escola!
Amo papelaria, cadernos, livros, estojos, é tudo que amo.
Amei seu post.
Abraços e bom fds.
Tem coisa melhor do que cheirinho de livro e material escolar novos. Não, não há. João Anzanello Carrascoza anda pelas minhas estantes. Faz parte dos novos a misturar-se aos clássicos. Bom ouvir-te falando com tanto amor dos livros.
ResponderExcluirAbraços,