domingo, 11 de maio de 2014

Olhar devagar

"... Olham querendo decorar suas feições. Olham querendo descobrir o que deles e dos seus está impresso na nova criatura. Alguns pais e mães não desaprendem de olhar com calma os filhos, mas há outros que perdem logo o costume."
 Pe. Fábio de Melo

Era sábado. Despertei antes das seis; bem poderia dormir mais um pouco, mas acho que é, como dizem, a força do hábito.
Abri janelas que não incomodariam quem ainda estivesse a dormir e tentei manter o maior silêncio possível.
O barulho, no entanto, veio da rua. Vozes exaltadas sugerindo discórdia, nosso cachorro atiçado saiu em disparada ao portão. Fui buscá-lo e então presenciei a cena.

Três jovens. O rosto ainda mantendo aquela feição pueril. Boas vestes de marca ou grife cara, talvez alguma marca ligada ao surf, à tribo dos skatistas, funk, não sei.
Havia discórdia na fala deles com um dos três tentando fazer as vezes da concórdia. Havia abraço e pedido para ficar "frio".
Um deles segurava uma garrafa de vodca e os outros dois seguravam duas latinhas, que foram deixadas no meu portão e ao recolhê-las soube ser energético.
Estavam embriagados, a coordenação trôpega.

Pensei em suas mães. Já se deram conta, tão cedo e os filhos não estão em casa? Certamente não dormiram em casa. Autorizados?

Saí para um compromisso com minha filha: um café comunitário em homenagem às mães.
Simplicidade e carinho deram forma à tudo o que aquelas pessoas prepararam. Inclusive as palavras.
Em algum momento, um voz agradável nos conduzia a uma reflexão e nos pedia em seguida a olhar para os nossos filhos como olhávamos quando eram recém-nascidos.

Percebi gestos tentando conter alguma lágrima fruto da emoção, narizes avermelhados e úmidos - idem o motivo.
Inevitável também foi não pensar nos três jovens, em suas mães.

Muitos poderiam argumentar se a juventude não foi feita justamente para essas pequenas transgressões.
Deixo a ingenuidade de lado e enxergo a possibilidade de um porre, noitadas, que podem fazer parte das descobertas de um jovem.
Mas e a destrutividade a que estão se impondo? Deixou a muito de ser uma descoberta.

O título desta postagem e a primeira frase são do padre Fábio de Melo, num belo texto onde ele fala sobre a nossa deficiência de olhar devagar, demoradamente como fazem ou faziam os pais com seus bebês.

Hoje é um domingo, dia das mães e meu desejo que o nosso olhar de mãe não desista. Porque não é fácil, especialmente depois que deixam de ser bebês e se tornam os adolescentes questionadores, desafiadores. Que nosso olhar não enfraqueça. Ao contrário, que olhar demoradamente fique forte, ou como dizem, é a força do hábito.

10 comentários:

  1. Que beleza de texto! E nosso olhar não pode desistir de ver nossos filhos com o amor de quando nasceram...Emocionante. Pena quando um filho nem ao menos liga pra sua mãe, nem aparece, simplesmente faz de conta nada acontecer.Pena,mas..Um dia ele lembrará, talvez seja tarde então, mas... Talvez até a mãe não consiga mais olhá-lo como antes.Quem sabe? beijos,chica

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  2. Eu realmente não acredito que a maternidade seja a maior missão de uma mulher, mas eu acho sinceramente que a maternidade é maior aventura na qual uma mulher pode se envolver... o que pode ser mais difícil do que educar um filhote de gente????

    Parabéns a você que consegue Ana!!! Por viver cercada de de crianças e adolescentes eu já sei que não é fácil!!!!

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  3. Ana Paula, que belo post!
    Muito importante esse tema, precisamos sempre nos lembrar de olhar devagar, porque na maioria das vezes acho que nem mesmo olhamos…
    Principalmente quando crescem, vai ficando mais e mais difícil.
    e acho que isso vale para tudo na vida: olhar devagar é a chave.
    Bjs e um feliz dia das mães!

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  4. Que lindo!
    Olhemos devagar, olhemos além da idade, dos maus humores...
    Olhemos inclusive além de para nossos filhos, para os outros como gostaríamos olhassem os outros para os nossos, com preocupação, bem querer e prece.

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  5. Um bonito olhar sobre o dia das Mães Ana
    é por aí mesmo_ o relacionamento mães filhos é um desafio_ quando bebês damos as mãos guiamos afagamos, o tempo encarrega de afastá-los. Precisamos cuidar para que as raízes os façam voltar,e se possível sãos e salvos.
    Parabéns pelo belo texto,
    abraços

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  6. E precisamos olhar com olhar de amor, de segurança, de afeto, mas eu sou uma mãe tão dura por vezes que a Alice sente medo de que eu brigue, ou ache ruim, dai ela não fala, percebi em algumas coisas que com o tempo ela me conta. Ah como é difícil educar e ser uma boa mãe e amiga!

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  7. Tenho um pedido a fazer: que os filhos aprendam a não somente olhar para os seus pais mas que também consigam enxergar as suas necessidades. Tempos difíceis estes em que é preciso aprender a tirar as vendas dos olhos,

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  8. Estou do "LADO DE FORA DO CORAÇÃO" batendo na porta e pedindo permissão para entrar... Aqui estou, acredito poder ocupar um cantinho dele.
    Amei tudo o que vi, o que li e me vi observando cada detalhe de meus filhos já adultos, então percebi que tanto fora em seus traços como em seus corações tem tanto de mim... agradeço ao senhor por me ter presenteado com esse tesouro maravilhoso que preservo cada minuto como diamantes lapidados.
    O mundo lá fora é muito cruel e se a casa não tiver um forte alicerce ela desmorona. Devemos estar atentos, vigilantes mas amar muito, o mais importante é o AMOR.
    Com um enorme carinho eu te covido para ocupar um cantinho do meu coração. Venha quando puder, te espero. Abraços MELISSA E ALECRIM
    http://melissaealecrim.blogspot.com.br/

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  9. Oi Ana.

    Já ouvi e li o Pe. Fábio falando sobre "olhar devagar". Acho que isso é um exercício que muito precisamos.

    Os pais precisam olhar seus filhos devagar, observar seu jeito, sua postura, suas carências e fazer de tudo para amá-lo, protegê-lo.

    O mesmo deve fazer os filhos com relação aos seus pais.

    A teoria é fácil de ser escrita. Mas não é fácil viver dessa forma.

    Os pais tem que sair cedo pra trabalhar, deixam seus filhos com babás (quando tem condições de pagar) ou deixam com os outros irmãos em casa. Chegam à noite, cansados, nem conversam.

    Os filhos já crescidos também não encontram tempo para "olhar devagar" os seus pais que agora já precisam de carinho, atenção...

    Enfim...

    Aqui tentamos olhar devagar uns para os outros.

    Bjo pra ti.

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  10. Ai, Ana, é hoje que não saio mais daqui de seu blog! Um texto mais interessante do que o outro, to presa!
    Aqui, me identifiquei muito com você em seus questionamentos. Meu trabalho me propicia, muitas vezes, estar frente a frente com mães que 'perderam' seus filhos para as drogas ou para o crime... Será que não começou com um 'inofensivo' porre? Com a tal ideia de liberdade que se vende por aí? Muito a pensar e a refletir...
    Só sei que, assim como você, não quero nunca perder este olhar demorado para as minhas 'crias', pedaços de mim, que tem em mim um espelho de como devem ser e viver. Nas atitudes deles, me vejo refletida muitas vezes...

    Lindo demais tudo que você escreve, sou sua fã! Beijos.

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